Mario Quintana (1906-1994) foi um dos maiores poetas da literatura brasileira e seus versos reverberam ao longo de gerações. Autor de poemas simples, acessíveis, que estabelecem com o leitor uma espécie de conversa, Quintana foi o criador de versos ecléticos que narram a sua própria origem, falam de amor ou tratam da própria criação literária. Show 1. Deixa-me seguir para o mar
Nos primeiros três versos o poeta pede que o seu desejo seja plenamente respeitado, isto é, que ele possa ser aquilo que é e que possa ir embora quando desejar. Logo a seguir, na segunda passagem, o sujeito poético identifica-se com um rio e pinta o cenário ao seu redor (as nuvens sobre si, as margens, as crianças que se divertem na água). Desejando identificar-se ainda mais com a imagem do rio, o poeta usa a metáfora para dizer que não se pode guardar o que está em movimento. O espelho não guarda a imagem daquilo que reflete (e lembremos que o próprio rio contém uma espécie de espelho, o espelho d'água), assim como impõe o movimento de passagem. O rio, assim como o poeta, flui. Vemos também, através da comparação do sujeito poético, a consciência da passagem do tempo. 2. Matinal
Profundamente imagético, Matinal é um poeminha poderoso que contém apenas três versos. No primeiro deles o sol é comparado à um tigre, que supostamente observa do lado de fora, tentando entrar em nossas casas através do olhar. No verso a seguir, vemos outra figura de linguagem uma vez que ao vento é atribuído o gesto de farejar, uma ação característica dos animais. Também aqui a comparação se alinha a do tigre, apresentada na primeira linha da criação. Por fim, somos transportados para um cais, onde os guindastes - devido à magnitude - são comparados aos dinossauros, uma visão poética de enxergar como as cargas são manipuladas. Em apenas três versos somos convidados a observar o mundo a partir de um olhar mais criativo e fresco. 3. Seiscentos e Sessenta e Seis
Seiscentos e Sessenta e Seis, conhecido também como O tempo, é dos mais famosos poemas de Mario Quintana. Ao longo dos versos o poeta expõe questões relacionadas com a transitoriedade do tempo. O passar das horas, dos dias e dos anos mobilizam o sujeito poético que reflete, olhando para trás, sobre o que fez da vida. Em tom de diálogo - com versos livres e uma estrutura informal - ele se direciona ao leitor e procura partilhar um conselho a partir da experiência do vivido. É como se o sujeito não pudesse voltar atrás, mas pudesse partilhar com os mais jovens, a partir da sua sabedoria, aquilo que realmente interessa. Conheça uma análise aprofundada do Poema O Tempo de Mario Quintana. 4. Presença
É partindo de duas dicotomias que se constrói o poema Presença: por um lado vemos os pares opositores passado/presente, por outro lado observamos o segundo par opositor que serve como base da escrita (ausência/presença). Pouco ou nada ficaremos sabendo dessa misteriosa mulher que provoca nostalgia cada vez que a sua lembrança é evocada. Aliás, tudo o que saberemos dela ficará a cargo dos sentimentos originados no sujeito. Entre esses dois tempos - o passado marcado pela plenitude e o presente pela falta - ergue-se a saudade, mote que faz com que o poeta cante os seus versos. 5. Espantos
Em somente quatro versos, Mario Quintana levanta a questão da religiosidade e da importância de se crer em algo superior. O poeta aqui admira como há eventos inacreditáveis e como há quem não acredite em alguma espécie de divindade mesmo diante desses acontecimentos. O título do poema (Espantos) se repete no primeiro verso e traduz a incredulidade do sujeito poético, que não consegue perceber como alguém não atribui a Deus eventos fascinantes que acontecem no dia a dia. Nos dois últimos versos há um jogo de palavras, os ateus - que não acreditam no sobrenatural - acabam por ser aquilo que existe de mais sobrenatural. 6. O pobre poema
O pobre poema é um metapoema, isto é, um poema que fala sobre a sua própria construção. É como se o poeta tirasse o véu que cobre o processo de criação e convidasse o leitor a espreitar o que se passa na oficina da escrita. O poema aqui parece ganhar vida própria e o poeta, sem jeito, não sabe bem o que fazer com ele. Comparando o poema com uma criança doente, o sujeito poético parece estar perdido, sem saber como conduzir a situação e como lidar com aquela criatura (o poema) que saiu de dentro dele. A meio de uma crise de desespero, sem saber o destino daquilo que criou sabendo-o incompatível com a realidade do mundo, o poeta resolve rasgar o poema em muitos pedaços.
A Rua dos Cataventos é um soneto, construído a partir de uma linguagem simples e informal. Nos versos vemos o passado do sujeito poético e a explicação de como ele se transformou naquilo que é. Trata-se, portanto, de uma lírica sobre a transitoriedade do tempo e sobre as mudanças inerentes ao nosso percurso pelo mundo. O poema é também uma celebração da vida, daquilo em que o sujeito se transformou depois de ter sofrido tudo o que sofreu. 8. Canção do dia de sempre
Como se convidasse o leitor para se sentar ao seu lado para refletir sobre a vida, é assim que Mario Quintana conduz a sua Canção do dia de sempre. Já no primeiro verso somos orientados a viver um dia de cada vez, extraindo beleza de cada instante e vivendo-o como se fosse único. Conseguindo encontrar encanto no cotidiano a vida fica mais fácil, é o que garante o poeta. Outra imagem muito cara à lírica de Quintana que também se apresenta no poema é a presença do rio como algo em permanente mudança e que nunca é capaz de ser capturado. O rio é considerado, portanto, uma metáfora da vida, um constante mutação. 9. Poeminha do Contra
Quem é que nunca ouviu falar nesses versinhos de Quintana? O Poeminha do Contra, que reúne apenas quatro versos, é das mais celebradas criações do poeta gaúcho. Todos nós algum dia já nos relacionamos com uma situação em que nada parece ir à frente. É tendo em conta esse cenário que o poeta se comunica com o leitor, garantindo que os empecilhos serão superados. Os últimos dois versos apresentam um jogo de palavras: passarão, o futuro do verbo passar, é colocado logo antes de passarinho, um tipo de ave que evoca delicadeza, liberdade. Conheça também a análise completa do Poeminho do Contra, de Mario Quintana. 10. Relógio
O relógio é um objeto que transmite a noção da passagem do tempo. Especialmente o relógio de parede é um utensílio intimamente ligado ao passado, às antigas gerações que o utilizavam dentro do espaço da casa. Ao longo dos versos, o poeta, para se referir ao relógio de parede, o compara a um agressivo animal doméstico. Ao invés de colocar em palavras duras e frias o fato dos parentes terem falecido, o sujeito poético prefere, através de um olhar criativo e lúdico, dizer que o tal animal feroz (o relógio) já engoliu três gerações da família. 11. Bilhete
O famoso poema Bilhete fala de um amor romântico, que é para ser vivido com discrição e sem medo, na intimidade do casal, sem fazer grande alvoroço em público. O poeta fala do amor de uma perspectiva delicada e singela. O próprio título do poema faz uma referência a um bilhete, um papelzinho trocado, que só os namorados têm acesso, criando uma cumplicidade entre os dois. Além de querer aproveitar esse momento apaixonado com a amada, respeitando a privacidade do casal, o sujeito, que demonstra profunda maturidade, sublinha que respeita também o tempo da relação dando espaço para que cada um sinta o amor da sua forma e no seu tempo. Conheça uma análise aprofundada do Poema Bilhete, de Mario Quintana. 12. II
Nessa criação o poeta Mario Quintana usa a forma clássica do soneto para compor um poema cheio de musicalidade. Lembrando uma canção de ninar, os versos são originais porque, ao invés de embalarem uma criança, embalam uma rua. O sujeito tem uma relação inesperada com a rua, transbordando afeto, prometendo protegê-la e demonstrando carinho (repare como ele usa o diminutivo “ruazinha”). Se, em geral, a rua costuma assustar os pequenos, aqui o poeta demonstra que o que nutre pelo espaço público é o sentimento de carinho. Conheça também: |