Furtos, roubos, subtrações ou impedimentos podem ser relacionados com qual tipo de violência?

A imprensa e muita gente frequentemente confunde os crimes de roubo e de furto. Ambos são crimes contra o patrimônio, mas têm diferenças importantes.

No furto, ocorre apenas a subtração de coisa alheia. O bem subtraído deve ser móvel. Não há furto de bem imóvel. No furto, não há violência contra a vítima.

Já no roubo, a subtração da coisa móvel alheia ocorre mediante violência, grave ameaça ou impedimento da resistência da vítima.

O simples batedor de carteira, por exemplo, aquela pessoa que retira um objeto de valor da vítima sem que esta perceba, não comete roubo, mas furto. Nesses casos, não há emprego de violência contra a vítima. Um exemplo famoso de furto foi o cometido contra o Banco Central do Brasil em Fortaleza (CE), em 6 e 7 de agosto de 2005. Ali, a quadrilha escavou um túnel até o cofre da entidade e subtraiu quase R$ 165 milhões. Como não aconteceu violência contra a vítima nem contra pessoa alguma durante a subtração, o caso foi crime de furto.

Também é furto a subtração de objetos da residência da vítima quando ela esteja ausente ou quando não perceba a ação.

Comete roubo o ladrão que use arma (ou simulação dela, como réplica de arma que gere temor na vítima), o que se valha de superioridade física ou numérica para subtrair o objeto do crime e o que use violência real contra a vítima. O emprego de arma, por si só, caracteriza grave ameaça contra a pessoa da vítima, e isso é elemento do crime de roubo.

É roubo o golpe conhecido como “boa noite, Cinderela”, em que alguém usa substância química para dopar a vítima e retirar seus bens, porque esta fica sem capacidade de resistir (assim decidiu o Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, ao julgar o recurso especial 1.059.943/SP).

Quando se fala em “assalto”, geralmente se presume ter havido violência contra a vítima. Portanto, nesses casos, em geral se trata de roubo, não de furto.

As penas do roubo e do furto são muito diferentes. No furto simples, a pena é de reclusão de um a quatro anos, mais multa (artigo 155 do Código Penal). No roubo simples, a punição é de reclusão de quatro a dez anos, mais multa (art. 157 do Código Penal).

Furto e roubo têm formas qualificadas descritas no Código Penal, isto é, formas especialmente graves, com penas mais altas.

A destruição de obstáculo para subtrair o bem (por exemplo, quebrar uma janela ou um sistema de alarme) torna o furto qualificado, com pena maior (reclusão de três a oito anos), mas não o converte em roubo.

O chamado latrocínio é o roubo acompanhado de morte, cometida seja para subtrair, seja para garantir a impunidade do crime (como quando o autor do crime mata a vítima durante a fuga, depois de já ter subtraído o objeto). A pena é de reclusão de vinte a trinta anos. Nesses casos, como a lei considera que o crime é cometido contra o patrimônio, o julgamento não é feito pelo tribunal do júri, mas individualmente pelo juiz criminal. O tribunal do júri tem competência constitucional para julgar os crimes contra a vida (homicídio, induzimento ao suicídio, infanticídio e aborto).

Quando ocorre subtração de dinheiro público, os crimes podem ser outros, em vez do roubo ou furto. Se a subtração de dinheiro público é praticada por funcionário público, há, geralmente, o crime chamado peculato (Código Penal, art. 312). A pena do peculato é de dois a doze anos de reclusão e multa, bem mais alta do que a do furto (que é de um a quatro anos, na forma simples).

Quando a subtração de dinheiro público é praticada por um particular utilizando fraude, geralmente há outro crime, o estelionato (Código Penal, art. 171, § 3.º).

Se prefeito municipal desvia dinheiro público, configuram-se crimes específicos, definidos no art. 1.º do Decreto-lei 201, de 27 de fevereiro de 1967, que trata dos crimes de responsabilidade dos prefeitos.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estabelece uma tipologia de três grandes grupos segundo quem comete o ato violento: violência contra si mesmo (autoprovocada ou auto infligida); violência interpessoal (doméstica e comunitária); e violência coletiva (grupos políticos, organizações terroristas, milícias).

a) Violência Autoprovocada/Auto Infligida: A violência autoprovocada/auto infligida compreende ideação suicida, autoagressões, tentativas de suicídio e suicídios.

b) Violência Interpessoal - Violência doméstica/intrafamiliar: Considera-se violência doméstica/intrafamiliar a que ocorre entre os parceiros íntimos e entre os membros da família, principalmente no ambiente da casa, mas não unicamente. É toda ação ou omissão que prejudique o bem-estar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao pleno desenvolvimento de outra pessoa da família. Pode ser cometida dentro ou fora de casa por algum membro da família, incluindo pessoas que passam a assumir função parental, ainda que sem laços de consanguinidade, e que tenha relação de poder. A violência doméstica/intrafamiliar não se refere apenas ao espaço físico onde a violência ocorre, mas também, às relações em que se constrói e efetua. Este tipo de violência também inclui outros membros do grupo, sem função parental, que convivam no espaço doméstico. Incluem-se aí empregados(as), pessoas que convivem esporadicamente, agregados.

c) Violência Interpessoal - Violência extrafamiliar/comunitária: A violência extrafamiliar/comunitária é definida como aquela que ocorre no ambiente social em geral, entre conhecidos ou desconhecidos. É praticada por meio de agressão às pessoas, por atentado à sua integridade e vida e/ou a seus bens e constitui objeto de prevenção e repressão por parte das forças de segurança pública e sistema de justiça (polícias, Ministério Público e poder Judiciário).

A OMS estabelece também distinções sobre as naturezas da violência, sendo elas:

a) Violência Física: Também denominada sevícia física, maus-tratos físicos ou abuso físico. São atos violentos, nos quais se fez uso da força física de forma intencional, não-acidental, com o objetivo de ferir, lesar, provocar dor e sofrimento ou destruir a pessoa, deixando, ou não, marcas evidentes no seu corpo. Ela pode se manifestar de várias formas, como tapas, beliscões, chutes, torções, empurrões, arremesso de objetos, estrangulamentos, queimaduras, perfurações, mutilações, dentre outras. A violência física também ocorre no caso de ferimentos por arma de fogo (incluindo as situações de bala perdida) ou ferimentos por arma branca.

b) Violência Psicológica/Moral: É toda forma de rejeição, depreciação, discriminação, desrespeito, cobrança exagerada, punições humilhantes e utilização da pessoa para atender às necessidades psíquicas de outrem. É toda ação que coloque em risco ou cause dano à autoestima, à identidade ou ao desenvolvimento da pessoa. Esse tipo de violência também pode ser chamado de violência moral. No assédio moral, a violência ocorre no ambiente de trabalho a partir de relações de poder entre patrão e empregado ou empregado e empregado. Define-se como conduta abusiva, exercida por meio de gestos, atitudes ou outras manifestações, repetidas, sistemáticas, que atentem, contra a dignidade ou a integridade psíquica ou física de uma pessoa, que ameace seu emprego ou degrade o clima de trabalho. Portanto, a violência moral é toda ação destinada a caluniar, difamar ou injuriar a honra ou a reputação da pessoa. O bullying é outro exemplo de violência psicológica, que se manifesta em ambientes escolares ou outros meios, como o ciberbullying.

c) Tortura: É o ato de constranger alguém com emprego de força ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental com fins de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; provocar ação ou omissão de natureza criminosa; em razão de discriminação racial ou religiosa. (Lei 9.455/1997). Também pode ser o ato de submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de força ou grave ameaça, provocando intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

d) Violência Sexual: É qualquer ação na qual uma pessoa, valendo-se de sua posição de poder e fazendo uso de força física, coerção, intimidação ou influência psicológica, com uso ou não de armas ou drogas, obriga outra pessoa, de qualquer sexo e idade, a ter, presenciar, ou participar de alguma maneira de interações sexuais ou a utilizar, de qualquer modo a sua sexualidade, com fins de lucro, vingança ou outra intenção. Incluem-se como violência sexual situações de estupro, abuso incestuoso, assédio sexual, sexo forçado no casamento, jogos sexuais e práticas eróticas não consentidas, impostas, pornografia infantil, pedofilia, voyeurismo, manuseio, penetração oral, anal ou genital, com pênis ou objetos, de forma forçada. Inclui também exposição coercitiva/constrangedora a atos libidinosos, exibicionismo, masturbação, linguagem erótica, interações sexuais de qualquer tipo e material pornográfico. Igualmente caracterizam a violência sexual os atos que, mediante coerção, chantagem, suborno ou aliciamento impeçam o uso de qualquer método contraceptivo ou forcem a matrimônio, à gravidez, ao aborto, à prostituição; ou que limitem ou anulem em qualquer pessoa a autonomia e o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos. A violência sexual é crime, mesmo se exercida por um familiar, seja ele, pai, mãe, padrasto, madrasta, companheiro(a), esposo(a).

e) Tráfico de seres humanos: Inclui o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento de pessoas, recorrendo à ameaça, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade, ao uso da força ou outras formas de coação, ou à situação de vulnerabilidade, para exercer a prostituição, ou trabalho sem remuneração, incluindo o doméstico, escravo ou de servidão, casamento servil ou para a remoção e comercialização de seus órgãos, com emprego ou não de força física. O tráfico de pessoas pode ocorrer dentro de um mesmo país, entre países fronteiriços ou entre diferentes continentes. Toda vez que houver movimento de pessoas por meio de engano ou coerção, com o fim último de explorá-las, estaremos diante de uma situação de tráfico de pessoas.

f) Violência Financeira/Econômica: É o ato de violência que implica dano, perda, subtração, destruição ou retenção de objetos, documentos pessoais, instrumentos de trabalho, bens e valores da pessoa atendida/vítima. Consiste na exploração imprópria ou ilegal, ou no uso não consentido de seus recursos financeiros e patrimoniais. Esse tipo de violência ocorre, sobretudo, no âmbito familiar, sendo mais frequente contra as pessoas idosas, mulheres e deficientes. Esse tipo de violência é também conhecida como violência patrimonial.

g) Negligência/Abandono: É a omissão pela qual se deixou de prover as necessidades e cuidados básicos para o desenvolvimento físico, emocional e social da pessoa atendida/vítima. Ex.: privação de medicamentos; falta de cuidados necessários com a saúde; descuido com a higiene; ausência de proteção contra as inclemências do meio, como o frio e o calor; ausência de estímulo e de condições para a frequência à escola. O abandono é uma forma extrema de negligência, é o tipo mais comum de violência contra crianças.

h) Trabalho Infantil: É o conjunto de ações e atividades desempenhadas por crianças (com valor econômico direto ou indireto) inibindo-as de viver plenamente sua condição de infância e adolescência. Refere-se a qualquer tipo de atividade efetuada por crianças e adolescentes de modo obrigatório, regular, rotineiro, remunerado ou não, em condições por vezes desqualificadas e que põem em risco o seu bem estar físico, psíquico, social e moral, limitando suas condições para um crescimento e desenvolvimento saudável e seguro. A Constituição Federal estabelece a proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a pessoas menores de 18 anos e de qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos (artigo 7º, inciso XXXIII). Quando na condição de aprendiz, a atividade laboral deve ocorrer em horários e locais que não impeçam a frequência à escola e não prejudiquem a formação e o adequado desenvolvimento físico, psíquico, moral e social.

i) Violência por Intervenção legal: Trata-se da intervenção por agente legal público, isto é, representante do Estado, polícia ou de outro agente da lei no exercício da sua função. Segundo a CID-10, pode ocorrer com o uso de armas de fogo, explosivos, uso de gás, objetos contundentes, empurrão, golpe, murro, podendo resultar em ferimento, agressão, constrangimento e morte. A Lei Federal nº. 4.898/65 define o crime de abuso de autoridade e estabelece as punições para esta prática.

Além dessas classificações, a violência pode ser definida considerando a qual grupo ou pessoa ela é direcionada: mulheres, crianças, idosos, indígenas, deficientes, população LGBT, etc.

O termo violência entre parceiros íntimos refere-se a todo e qualquer comportamento em uma relação íntima. Inclui a violência cometida tanto na unidade doméstica como em qualquer relação íntima de afeto, independentemente de coabitação, e compreende as violências física, psicológica, sexual, moral, patrimonial e o comportamento controlador.

Entende-se esse tipo de violência como um comportamento conscientemente hostil e intencional que causa dano físico, psíquico, jurídico, econômico, social, moral ou sexual. Atua contra a liberdade e o direito da pessoa.

Para muitas mulheres a agressão física não é um evento isolado, mas parte de um padrão contínuo de comportamento abusivo, ou seja, muitas vezes os atos de violência física acontecem de maneira sistemática dentro da dinâmica do casal, ocorrendo frequentemente, podendo chegar até a episódios diários.

O abuso de álcool e outras drogas foram consideradas por muitas pesquisas como um fator associado à violência física entre os parceiros.