O papel da escola: obstáculos e desafios para uma educação transformadora

Diante das transformações: social, econômica e cultural do mundo Pós- moderno. A escolar tem sem dúvida, uma função importantíssima, por ser ela um território coletivo de construção de identidades, produção de conhecimento e transformação social.

Ao refletir sobre as mudanças que vem ocorrendo em todo mundo, o surgimento de grandes movimentos sociais, tanto no campo, social, econômico e político, quanto no campo da cultura, da ciência e da tecnologia a globalização da economia, das comunicações e da cultura. 

Surge um novo tempo de expectativas, de perplexidade e da crise de concepções e de paradigmas, é nesse contexto que se propõe que educação se constitua em um mecanismo de democratização, onde se valoriza os valores da solidariedade, da reciprocidade e das novas alternativas de produção e de consumo.

Para Sales (2012) a escola como instituição social tem a incumbência de garantir aos que nela ingressam a construção saudável de saberes e competências necessárias para o enfrentamento dos desafios que a atual sociedade lhes apresenta.

Sabe-se que a educação é um processo que engloba aspectos cultural, filosóficos, biológicos e psicológicos da espécie humana. Nesta ótica faz necessária a mobilização de políticas públicas da educação no que cerne o papel da escola e do professor no processo de construção de um conhecimento, a busca pela qualidade na educação deve ser um processo constante das instituições de ensino, visto que, num contexto de mudanças na qual nos encontramos onde a globalização está em evidência. Não basta, apenas dar acesso à escola, é preciso garantir uma aprendizagem significativa que preparar o aluno não para sobreviver, mas sim formá-los no sentido de que possam fazer parte, atuando como sujeitos em busca permanente de mudanças

Na dinâmica da modernidade, a escolas precisam de profissionais motivadas, responsáveis, dinâmicas, capacitados, com habilidades para solucionar problemas e tomar decisões capazes de compreender que o objetivo da educação e da relação educativa na sociedade pós-moderna é favorecer a promoção de um processo de aprendizagem emancipadora, dinâmica e ao mesmo tempo humanista visando formar cidadão crítico e consciente.

A escola precisa buscar saberes que instrumentalizam para responder questões fundamentais referentes à ética, à cidadania, à solidariedade, .transformado-os em novas prática pedagógicas e ações educativas que permitam enfrentar as incertezas.

De acordo com Perrenoud (2007) o professor no seu cotidiano enfrenta problema na sala de aula, necessitando recorrer às competências adquiridas na formação inicial, e buscar novos conhecimentos durante o exercício da profissão que o leve produz os resultados almejados. Portanto há necessário de formação continuada de professores, adaptação do currículo, novas metodologias e técnicas que favoreça a aprendizagem.Portanto é fundamental a formação inicial e continuada de professores de igual modo os planos de carreira, as condições de trabalho e a valorização profissional, como meio de atender a demandas e as pressões sociais.

No Brasil, as condições de trabalho do professor, a carreira e os salários da educação básica não são atraentes nem recompensadores, e a sua formação está longe de atender a diversidade encontrada no cotidiano de sala de aula.

É sem dúvida, necessário que ocorra mudança no quadro da educação brasileira, não só uma melhoria, mas sim, uma transformação. Ajuste nas politicas de formação e capacitação de professores, melhoria nas condições de trabalho e remuneração digna, bem como práticas educacionais baseadas em evidências científicas. Mesmo se essas condições fossem adotadas, ainda haverá uma parcela de estudantes com dificuldades para acompanhar o processo de aprendizagem, necessitando acompanhamento de um profissional especializado..

Nesse sentido há necessidade de uma pedagogia, transformadora em suas manifestações, que ofereça um referencial geral mais seguro para a formação de um sujeito holístico. Cabendo à escola aproveitar de todas as riquezas de informações superar a visão utilitarista e ser centro de inovação, oferecendo informações “úteis” que atenda as necessidades de uma sociedade que reivindica uma formação geral na direção de uma educação inclusiva e íntegra, para todos.

É inerente que a escola cultuei o conhecimento como espaço de realização humana, de alegria e de contentamento cultural, onde produzir, construir e reconstruir conhecimento, sem ser excludente como diz Mantoan (2006) é preciso assegura que a escola inclusiva redefina seus planos para uma educação voltada para a cidadania global, plena, livre de preconceitos, que reconheça e valorizas diferenças.

Vivemos na era da pós-modernidade onde a escola precisa propor inovações, reestrutura seu currículo, inovar e sistematizar sua prática. De acordo com a teoria da complexidade de Morim (1986), o mundo pós-moderno, a educação não pode ser fragmentada como no mundo moderno, mas sim, uma educação integral e holística, para tanto, Morim propõem os quatros pilares da educação, aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender conviver e aprender a ser e os sete saberes necessário a educação do futuro. O conhecimento, o conhecimento pertinente, a identidade humana, a compreensão humana, a incerteza, a condição planetária e a antropo-ética. Desta forma, entende-se que a escola cumpre seu papel como espaço de formação na construção do homem da sociedade pós-moderna.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACED - PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO 2004 O PAPEL DA ESCOLA: Obstáculos e Desafios Para Uma Educação Transformadora Dissertação de Mestrado Mestranda: Márcia Silvana Silveira Barbosa Orientadora: Carmen Lucia Bezerra Machado Porto Alegre 2004

Márcia Silvana Silveira Barbosa O PAPEL DA ESCOLA: Obstáculos e desafios para uma educação transformadora Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul no Núcleo de Estudos e Pesquisas em Trabalho, Movimentos Sociais e Educação TRAMSE - como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação. Orientadora: Profª Drª Carmen Lucia Bezerra Machado Porto Alegre 2004

Ao encerrar este momento de minha caminhada como aprendente da área da educação, quero agradecer a todos que estiveram ao meu lado, apoiando-me e incentivando-me para a realização do meu sonho:... aos meus pais, Telmo e Cléa e à querida vó, Ernestina, que tanto lutaram pela minha escolaridade e educação;... à minha orientadora e amiga, Carmen Lucia Bezerra Machado, pela atenção, cuidado e respeito que teve em relação ao meu tempo para a realização da dissertação;... ao meu marido, Carlos, e ao meu filho, Marcel, por terem estado comigo nesta jornada de estudos;... à minha querida fada Profª Marlene Ribeiro que acreditou em mim, oportunizando-me a partilha de suas excelentes aulas;...a todos os colegas da FACED que comigo partilharam as aulas, enriquecendo o meu saber;... à Direção do Colégio Nossa Senhora da Glória, por ter aceitado o desafio de abrir o espaço escolar para o trabalho de pesquisa em educação;... aos meus alunos e colegas professores que colaboraram significativamente com dados para esta pesquisa, em especial ao Prof. Taurio, presidente da AEC/RS, pela excelente contribuição;... ao Prof. Walmor, coordenador pedagógico da AEC/RS, por permitir a utilização do material, que apresenta conclusões de professores referentes ao tema, debatido no seminário de educação promovido pela instituição citada. Obrigada.

RESUMO O trabalho tem como objetivo abordar o papel da escola e a temática da educação. Este nasceu dos dilemas que vivenciei e das indagações que faço, como educadora, no ambiente escolar. Através das falas e dos discursos proferidos no cenário da escola, entendo de que forma os protagonistas do processo educativo vêem as relações entre teoria e prática, assim como as implicações destas perspectivas para a sua prática pedagógica. Procuro identificar os obstáculos da escola e até quando ela assume o desafio de derrubar e destruir formas inúteis de trabalho, que dificultam um aprendizado, avançando para uma metodologia capaz de libertar de preconceitos nocivos, que emperram um novo fazer, contribuindo para a formação de sujeitos críticos que possam intervir na realidade e auxiliar na edificação de uma sociedade nova. Tendo presente a situação do ensino no Brasil, reforço a idéia que aponta a escola como um espaço privilegiado de luta, mesmo no seio de um sistema anti-solidário e excludente; mas, considero que é de fundamental importância reconhecer os mecanismos que dão sustentação ao fazer escolar nas práticas cotidianas, buscando identificar os instrumentos reprodutores e segregadores da educação brasileira. Este trabalho é um recorte da realidade educacional do Brasil e uma tentativa de entender os obstáculos e os desafios da prática escolar. O centro de minha pesquisa se desenvolve no Colégio Nossa Senhora da Glória, localizado em Porto Alegre, e tem o perfil de uma investigação qualitativa como metodologia para coleta e análise dos dados. É uma instituição católica na qual o projeto educativo possui o compromisso com a Educação Evangélico-Libertadora. Contudo, não fico atrelada apenas a esse contexto de estudo, investigando educadores e educandos envolvidos em outros cenários educacionais, que também são foco de minhas observações. A partir dessas informações, procuro compreender as contradições e os conflitos pertinentes à prática educativa, no intuito de buscar o entendimento do papel da Escola e a compreensão do ideário dos sujeitos a respeito de conhecimento/educação/ política/mercado/ trabalho.

ABSTRACT The assignment has the objective of talking about the school role and the subject matter of education. It arose from the problems that I've faced and the questionings I ask as educator in my school environment. Through the talking and the speeches used in the school, I understand how the main characters of the educational process see the relationship between theory and practice, as well as the implications of these perspectives to educational practice. I seek to identify the school obstacles and how long it assumes the challenge of bringing down and destroying useless ways of work, which make a real learning difficult, advancing to a methodology capable of releasing from harmful prejudices that jam a new doing, contributing to educate critical people who can intervene on the reality and help to build a new society. Knowing the educational situation in Brazil, I reinforce the idea which points the school as a privileged place of fight, even in a non-supportive and excluded system; but I consider being of fundamental importance to recognize the mechanisms that give support to scholar doing in everyday practices, searching to identify the reproducing and segregating instruments of the Brazilian education. This assignment is a clip from the Brazilian educational reality and an attempt to understand the obstacles and challenges of the scholar practice. The heart of my research develops at "Colégio Nossa Senhora da Glória" in Porto Alegre and has the feature of a qualifying investigation as methodology for collection and analysis of information. This is a catholic institution where the educational project has the commitment with the evangelical-liberator education. However, I don t grab my attention only to this context of studying, searching to investigate involved students and educators from other educational environments, which are also the angle of my observation. From these information, I try to understand the relevant contradictions and conflicts related to the educational practice, with the purpose of seeking an understanding of the school role and the comprehension of the common thoughts from the subjects about the relation knowledge/education/politics/market/work.

SUMÁRIO RESUMO ABSTRACT 1. INTRODUÇÃO 08 2. A APRENDENTE, TRABALHADORA DA EDUCAÇÃO E DA ESCOLA: UMA RELAÇÃO NECESSÁRIA 2.1 Despertar da aprendente em educação 13 2.2 Caminhos percorridos na busca de respostas e de novos fazeres: procedimentos metodológicos 20 2.3 Cenários expressivos de vida, do conviver e educar-se 31 2.4 Organização do espaço físico e o cotidiano escolar 44 3. O PAPEL DA ESCOLA: OBSTÁCULOS PARA UMA EDUCAÇÃO TRANSFORMADORA 3.1 Ideologia e suas manifestações veiculadas no discurso da escola 62 3.2 Escola, mercado e suas relações na esfera do trabalho humano 85 3.3 Disciplina escolar: limites e relações conflitivas 107 3.4 Escola e a massificação da cultura 124 4. O TRABALHO DOCENTE: OBSTÁCULOS E DESAFIOS DE UM NOVO FAZER ESCOLAR 4.1 O projeto político-pedagógico: conflito entre teoria e prática 143 4.2 Importância do conhecer como instrumento para ler criticamente o mundo 167

4.3 Obstáculos e desafios do ser professor 183 4.4 Desafios de novos fazeres na busca de uma educação libertadora 201 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 212 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 218 7. APÊNDICES 224 8. ANEXOS 244

1. INTRODUÇÃO O presente texto apresenta a dissertação, na qual abordo O PAPEL DA ESCOLA, SEUS OBSTÁCULOS E DESAFIOS para uma prática pedagógica que conduza a um desvelamento da realidade e ao reconhecimento das estratégias que dão embasamento à educação tradicional que nega um fazer escolar fundamentado na educação transformadora - libertadora. Assim, busco entender como os sujeitos que compõem a escola estabelecem relações entre teoria e prática, a fim de identificar os obstáculos e desafios no processo educativo. O papel que a escola ocupa hoje na sociedade brasileira é complexo. Muitas vezes ela contribui para a exclusão dos meios necessários à vida digna, pois as estruturas mais fortes organizam-se para privilegiar grupos e pessoas; as consciências são levadas por aquilo que fica parecendo natural no ambiente, tornando-se inquestionável e aceito pelo senso comum. A escola reforça esta prática e reproduz o egoísmo, o individualismo e a competição, elementos essenciais ao

mundo em que predomina o mercado. A organização do fazer escolar é repetidora do sistema social injusto que a sociedade criou e o mantém como forma de emperrar mudanças que possam alterar a ordem dominante. Reconhecer a roupagem, ou seja, como a escola se apresenta, e desvelar o discurso ideológico que ela utiliza é de vital importância para percebermos os mecanismos que dão sustentação a este tipo de instituição, reproduzindo as práticas educativas discriminatórias, essenciais à manutenção do sistema capitalista vigente. O sistema 1 dominante é presidido por uma lógica que limita as práticas pedagógicas inovadoras. O modelo que vigora é, em si mesmo, antisolidário e aliena do social, pois, tem medo da criatividade, da rebeldia e da participação. Não interessa, a este, uma escola geradora de conhecimento, capaz de formar pessoas com as habilidades de pensar criticamente, questionar e intervir na realidade. Para tanto, considerando a estrutura do sistema capitalista na sociedade brasileira e as relações de poder que regem a educação no Brasil, procuro identificar para quem ela está a serviço, impedindo a construção de uma escola com uma práxis educativa politicamente inovadora. Tento entender como as relações dominantes se manifestam no cotidiano da escola e a forma como as mesmas se apresentam no subjetivo dos sujeitos, fazendo com que eles reproduzam, condicionados ideologicamente, os mecanismos de controle sóciopolítico. Procuro compreender o contexto sócio-educacional em que está inserida a criança brasileira e seus aspectos de humanização/desumanização que imperam na conjuntura social. 1 Conceito apresentado do item 3.2

O fazer docente enfrenta empecilhos que o desafia a uma ação pedagógica diferenciada, visto que a escola está mergulhada, como parte, de uma sociedade que, por si só, é geradora de exclusão. Procuro reconhecer os movimentos que ocorrem no ambiente escolar e que rompem com a neutra pedagogia dominante do giz e da funcional reprodução mecânica dos conteúdos impostos, ou seja, aquela pedagogia que não se compromete e nem se posiciona, mantendo-se aparentemente imparcial e distanciada dos acontecimentos históricos. Busco investigar a respeito da formação teórico-metodológica e em qual contexto está inserido o educador brasileiro, a fim de entender os obstáculos que dificultam e emperram uma educação que assuma um discurso comprometido com um agir transformador, mesmo no seio de um sistema estruturado para a reprodução. Tendo presente a situação do ensino no Brasil, reforço a idéia que aponta a escola como um espaço privilegiado de luta, mesmo em um contexto que gera desigualdades, mas considero ser de fundamental importância o reconhecimento dos mecanismos que dão sustentação ao fazer escolar nas práticas cotidianas, buscando identificar os instrumentos reprodutores e segregadores da educação brasileira. Entendo que é necessário superar a visão que aponta a escola como o principal palco de formação do indivíduo e um lugar exclusivo do ensino. Acredito ser essencial visualizar outros cenários da existência humana, cuja diversidade de histórias de vidas são espaços efervescentes para potencializar a escola de forma que ela possa, nutrindo-se do real, alavancar a passagem do ensino à educação integral dos sujeitos; dos programas rígidos aos planos de vida social. A escola sozinha não faz a transformação da sociedade, mas uma educação crítica, radical e libertadora é um dos instrumentos necessários ao

aglutinamento de forças transformadoras e gestadoras do trabalho de formação de seres com consciências críticas. Para tanto, considero essencial um novo fazer educativo que supere uma educação espontânea, ingênua e acrítica que reproduz e reforça a exclusão social. Por mais que esteja emperrada pelo jogo do poder, a transformação social se realiza através das pequenas mediações que estão ao alcance real das ações pedagógicas inovadoras. As sociedades não são estáticas, e é preciso perceber e lançar mão das contradições que as engendram. Assumir um discurso e uma prática comprometidos com o novo, que sejam transformadores, é a proposta em discussão, mesmo estando o contexto escolar submerso em estruturas velhas e arcaicas. É necessário alterar a idéia de que somente através de uma revolução pode-se chegar a uma mudança estrutural verdadeira da sociedade. A ação imediata tem sua importância e é significativa no câmbio histórico. O conhecimento se constrói a cada dia, dada a superação que vai ocorrendo através de novas descobertas. A realidade, portanto, é algo essencialmente dinâmico. Perceber este dinamismo e lançar mão de uma pedagogia da práxis vinculada ao movimento social que extrapole os muros da escola, é a proposta de minha dissertação, visando a construção de um outro tipo de educação que ouse assumir novas práticas, que pressupõem a compreensão da realidade material. Esta proposta pedagógica é defendida por Freire em sua obra e, para tanto, recorro a este pensador para fundamentar as conclusões do objeto de estudo e aquilo que penso no universo da educação. Acredito que criar condições favoráveis ao advento do novo, apreendendo os movimentos contraditórios da natureza e da sociedade, descobrindo seus limites e desmascarando tudo que procura deter o

desenvolvimento de forças de luta, é o grande compromisso dos educadores do milênio que desponta; preocupados em assumir uma postura coerente com um discurso libertador, demonstrando capacidade necessária para liderar um espaço escolar diferente e ousado. Para tanto, quando falo no novo/inovador, a conotação que dou aos termos está associada a mudanças radicais, capazes de abalar e de alterar as relações de poder e que possam auxiliar no caminho construtor de um projeto de transformação do sistema, centrado no bem coletivo do povo. Transformar a escola em um espaço formador de posturas rebelde-indagadoras e de inserção social é o grande desafio 2 de uma outra educação que, juntamente com as demais forças transformadoras, possa intervir na construção de um projeto de sociedade com a possibilidade de colocar a escola a serviço da valorização da vida e da dignidade. Assim, penso o papel da escola e da organização do trabalho escolar, pois entendo que a leitura e a interpretação da totalidade do contexto educacional do Brasil, aliados a um outro fazer educativo, sejam instrumentos de resistência e de luta contra uma visão autoritária de um modelo escolar, sem sintonia com a realidade social da criança brasileira. 2 Desafio: Entendo por desafio possibilidades que impulsionem o educador a uma prática educativa diferente, ousada e crítica, que auxilie no movimento de transformação social.

2. A APRENDENTE, TRABALHADORA DA EDUCAÇÃO E DA ESCOLA: UMA RELAÇÃO NECESSÁRIA 2.1 Despertar da aprendente em educação Este trabalho tem como objetivo abordar uma temática que muito tem me inquietado durante minha trajetória como aprendente na área de educação. Constantemente, tenho me questionado a respeito do papel da escola e de como fazer uma educação transformadora inserida em um contexto no qual grande parte das forças do sistema educacional insiste em se manter e resiste à mudança desse modelo. Minha caminhada na educação já completa dezenove anos e, durante este tempo,.em que fui (e sou) 1 aprendente, indaguei os fazeres 1 Utilizo os verbos no item 2.1 no tempo passado por estar narrando meu despertar na área da Educação. Muitas colocações enquadram-se também no presente, na medida em que continuo como aprendente e indagadora da forma como se descortina o papel da escola.

da escola e a forma como o sistema de ensino se apresentava no cotidiano escolar. Nos caminhos que trilhei fui fazendo observações e participando ativamente do cenário 2, integrada ao meio no qual passei a contestar a forma e a prática que iam se descortinando no contexto da escola. Este processo, onde fui construindo minha visão e meu pensamento como educadora, associado à idéia de que uma outra educação é necessária, não foi algo simples, mas decorrente do percurso que trilhei, dos erros que eu própria cometi, reproduzindo velhas práticas do fazer docente e, dos obstáculos que tive que transpor para vencer a alienação do trabalho escolar. Meu percurso profissional iniciou em 1985, quando me formei no curso de Bacharelado em Ciências Sociais, e, no ano posterior, em Licenciatura Plena na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Em 1986, ao concluir meus cursos de graduação, ingressei no mercado de trabalho começando minha carreira profissional na área de Licenciatura. No ano de 1995 voltei à PUCRS, no curso de Especialização em Ciência Política, o que contribuiu muito para meu aprendizado. Comecei a lecionar no Colégio São Judas Tadeu, escola que serviu para meu grande aprendizado, pois trabalhei em diversas séries, com diferentes faixas etárias, proporcionando-me uma experiência enriquecedora dentro do Magistério, aprendendo muito com meus alunos. Trabalhei, também, na mesma escola no curso Supletivo, onde muitos dos discentes eram adultos que haviam retornado aos estudos. Para mim, essa foi a mais rica das experiências em meu início de carreira. 2 Ao longo do texto utilizo as palavras cenário e/ou espaço por considerar o lugar onde a trama social e política é desenvolvida pelas relações dos sujeitos que a compõem.

No final do ano de 1987, fui chamada pelo Colégio Nossa Senhora do Rosário para substituir pelo período de três meses, uma professora em licença gestante. Em 1988, iniciei como professora no Colégio Nossa Senhora da Glória onde leciono até hoje, no Ensino Fundamental, trabalhando com as disciplinas de História/Geografia (sextas e oitavas séries) e Sociologia (segundos anos), no Ensino Médio. Atualmente, além do exercício da minha profissão na escola, faço parte do setor de assessoria pedagógica da Associação de Educação Católica do Rio Grande do Sul (AEC-RS), auxiliando, também, com publicações de artigos no Boletim Trimestral desta instituição. Ao longo de minha vida, atuando como professora, participei de seminários, fóruns e congressos ligados à educação, procurando, através destes espaços, pensar e analisar a realidade educacional e refletir sobre momentos históricos significativos. Em fevereiro de 2001, participei do Congresso de Pedagogia, em Cuba, que reuniu seis mil educadores de vários países do mundo, o instigando, ainda mais, minha reflexão a respeito da educação no Brasil. Nos primeiros anos em que exerci minha profissão, senti-me decepcionada em muitos aspectos que observava em meu ambiente de trabalho e, muitas vezes, eu mesma acabava aplicando em minhas aulas uma educação tradicional, preocupada em cumprir o programa (compromisso ingênuo), pensando ser bom para o aluno e passando elementos da cultura, acumulados historicamente. Essa situação frustrou-me a ponto de eu mesma questionar a respeito de minha vocação. Custei a perceber que estava apenas reproduzindo a educação predominantemente tradicional 3 recebida e que também era colocada em prática por muitos de meus colegas de trabalho. Comecei a criticar aquela situação e

a nossa conduta como educadores. Parte dessa conscientização deveu-se às minhas leituras a respeito do assunto, mas principalmente as leituras de Paulo Freire, a quem devo meu amadurecimento e aprendizado no campo da educação. Inserida no contexto escolar, aprendendo com minhas vivências e com meus alunos, fui detectando problemáticas e fazendo descobertas que me inquietaram e aguçaram minha busca por novas respostas. As observações que fiz e os problemas que percebi me aproximaram da obra de Freire na tentativa de compreender o universo da educação. Quanto mais fui compreendendo suas idéias, mais fascinada ficava com minhas descobertas e minha percepção dos fenômenos, tornando-me uma crítica em relação à educação conservadora e elitista que atende aos interesses das classes dominantes, no sentido da não elevação do nível de consciência crítica do aluno. Estou convencida de que o grande educador Paulo Freire deixou a todos os trabalhadores da educação um legado muito importante: colocar o ser humano como centro do processo educativo, exaltando sua capacidade de educar-se como sujeito histórico. Tendo consciência dos próprios erros que cometi, fazendo uma análise crítica e buscando a superação dos mesmos, comecei a perseguir uma outra educação que extrapole os muros da escola e que se aproxime dos problemas reais e das decisões políticas e econômicas importantes para o Brasil e para o mundo. Comecei a contestar o foco de atenção do professor e dos alunos: o que é mais importante, o programa ou a prática social? 3 Estudei até a 8ª série em uma escola católica de freiras. Nessa época, em plena ditadura militar, vivenciei momentos que me instigaram a pensar e criticar situações que se apresentavam no cotidiano escolar. As mesmas me inquietaram, levando-me a insistir com meus pais para trocar de escola. Fui a única, dentre três irmãs, que não concluiu o ensino naquele estabelecimento, cursando o segundo grau em uma instituição de irmãos, mais aberta, onde as práticas discriminatórias eram menos constantes. Em 2002, ao participar de um congresso da AEC, no Paraná, encontrei a diretora (que ainda permanece no cargo) e relembrei parte de minha história, dos tempos educadores em que comecei a contestar o sistema de ensino. Percebi que não guardo mágoas. Que bom.

Percebi que o trabalho do professor é fazer o aluno se debruçar sobre a realidade, tentando entendê-la. E para ajudar o aluno a entender e a se posicionar, o professor precisa lançar mão da cultura construída pela humanidade. Entendi que o papel social, enquanto educador, é ajudar a mediação alunoconhecimento-realidade. Comecei a pensar sobre a Prática Pedagógica e como vencer a alienação deste trabalho. A partir disso, comecei a coordenar projetos de formação humana e política no Colégio Glória, de educação católica. Assim, várias atividades foram trabalhadas, a partir de 1998, das quais citarei apenas duas que foram extremamente significativas e que marcaram história em nossa escola. A primeira delas foi à divulgação do abaixoassinado, liderado pela Comissão Brasileira de Justiça e Paz pela aprovação do Projeto de Lei, de iniciativa popular, para combater a corrupção eleitoral. Foram realizados debates a respeito do tema participação política, que levaram alunos e pais a se envolverem na campanha. A segunda, que é a razão de minha escolha para o curso de pós-graduação na área da educação, diz respeito à minha aproximação, juntamente com meus alunos, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Vários trabalhos foram desenvolvidos no Colégio Glória com a participação do MST e da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Esta aproximação foi feita através de seminários, palestras, dinâmicas de aula com os sem-terrinhas (crianças do MST), feiras e outras atividades extremamente significativas e enriquecedoras. O livro Para uma Melhor Distribuição da Terra, versão popular escrita por Frei Betto, a pedido da CPT, serviu como referencial teórico para os debates, com e entre alunos, a respeito do desafio de resgatar a terra como bem social. Este livro é a versão popular do documento lançado em 1998, pelo Conselho de Justiça e Paz do Vaticano. Trata-se da palavra oficial da

Igreja Católica a respeito da Reforma Agrária. O professor Pedrinho Guaresqui auxiliou-me nesta ousadia, incentivando-me e proferindo palestra pertinente aos movimentos sociais, a quem devo agradecimentos. Não foi tarefa fácil colocar em prática esse trabalho na escola. Por incrível que pareça, a reação maior veio por parte de alguns professores e pais possuidores de visões e concepções constituídas a respeito dos movimentos sociais. O desenvolvimento deste trabalho provocou e continua provocando reações de professores considerados progressistas. Muitos respaldam suas idéias a partir de informações veiculadas pela mídia, o que impossibilitou a continuidade do projeto. Tive que recuar para continuar avançando. Não desisti, apenas mudei minhas estratégias de ação no cenário da escola. Continuo sonhando o sonho possível, na busca de uma educação emancipatória. Ir contra o pensamento reacionário e conservador é extremamente importante para que todos possam viver dignamente. É preciso ter presente que todo conflito é significativo e pode fortalecer a resistência e a disposição da luta, contribuindo para que algo novo surja (transformação). Todas estas questões e situações, que vivi como professora, fizeram-me buscar fundamentação teórica que respaldasse minha prática, perseguindo instrumentos que me ajudassem a entender e a enfrentar os constantes dilemas do espaço escolar. Com isso, voltei aos bancos universitários, ingressando em 2002 no Curso de Mestrado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na linha de pesquisa Trabalho, Movimentos Sociais e Educação, por considerar a importância da relação das três esferas citadas no âmbito da educação. A realização das diferentes disciplinas que cursei, durante o mestrado nesta universidade, os diferentes autores que li e com quem dialoguei, os

trabalhos que realizei e os debates com colegas e professores foram extremamente significativos para a construção do meu trabalho de dissertação. Concluindo esta etapa de minha vida, pretendo continuar minha caminhada como aprendente e educadora, defendendo a escola como um espaço significativo de luta por uma sociedade alternativa que respeite a vida e o planeta em que vivemos, buscando articular teoria e prática, vencendo obstáculos, ou seja, enfrentando dificuldades e assumindo os desafios da desconstrução do modelo reprodutor para a edificação do fazer profético de uma sociedade nova.

2.2 Caminhos percorridos na busca de respostas e de novos fazeres: procedimentos metodológicos Este trabalho nasceu das constantes indagações que fiz e continuo fazendo, como educadora, no ambiente escolar. Convivendo no espaço da escola, como trabalhadora da educação, percebo os obstáculos 1 que fream um novo fazer educativo, mas que, ao mesmo tempo, instigam a desafios na busca de uma prática transformadora, na qual homens e mulheres se tornem sujeitos de sua própria educação (Freire, 1999, p. 28). O problema de pesquisa surgiu de minha procura por respostas, na medida em que fui detectando conflitos e contradições nos caminhos que trilhei e continuo trilhando como professora. 1 Ao longo da dissertação uso termos como dilemas, empecilhos, problemas, empregando-os num sentido semelhante ao que dou à palavra obstáculo, ou seja, tudo aquilo que dificulta uma prática escolar transformadora.

Portanto, partindo de minha vivência, busco aprofundar o tema O Papel da Escola e, através da investigação, preencher algumas lacunas para uma compreensão mais ampla e crítica do contexto educacional e do cotidiano escolar. Devido à complexidade do objeto de estudo, busco investigar, através de uma pesquisa que leva em conta a interação dinâmica entre os dados da totalidade, perseguindo uma postura crítica e de permanente repensar, para a compreensão do papel que a escola desempenha na educação brasileira. Para focar meu olhar sobre os espaços educacionais e sobre os sujeitos, procuro uma metodologia cujos caminhos descrevo agora. Minha pesquisa se desenvolve no colégio particular Nossa Senhora da Glória e tem o perfil de uma investigação qualitativa para coleta e análise dos dados. Esta escola localiza-se no bairro Glória, em Porto Alegre, e pertence à Congregação do Imaculado Coração de Maria (ICM). Não estudo a forma e o funcionamento desta escola e, portanto, não se constitui em um estudo de caso. Assim, as conclusões que apresento não se restringem apenas a este espaço de estudo. Partindo do cenário desta instituição de ensino, busco entender, através de respostas que foram se evidenciando, com as indagações, os problemas e, sobretudo, os desafios necessários que possibilitem perseguir uma educação que extrapole o espaço da escola. É um colégio católico no qual o Projeto Educativo tem o compromisso com a Educação Evangélico-Libertadora fundamentada no projeto libertador de Jesus Cristo, em fidelidade à Igreja na América Latina e ao projeto pedagógico de Bárbara Maix (Projeto educativo - ICM, p. 39), documento tomado como referência oficial para a análise da concepção da escola sobre si mesma, em termos oficiais.

Assim, as religiosas afirmam que se propõem a assumir uma educação com compromisso efetivo com a transformação de todas as estruturas injustas que sustentam e mantém a sociedade. Esta escola apresenta diversas características que possibilitam a obtenção de respostas importantes para clarear alguns aspectos ligados aos objetivos deste trabalho, pois possui um espaço físico-material aberto para as indagações da pesquisa, onde os protagonistas das rotinas da escola contribuem enormemente para a análise e interpretação dos obstáculos e desafios do fazer escolar 2. Considero um cenário propício para ajudar a entender as relações que perpassam entre os sujeitos da escola e que muitas vezes não são visíveis (ocultas) e nem fáceis de serem percebidas e compreendidas em suas intenções. É um estabelecimento de Ensino Fundamental e Médio com aproximadamente 1.200 alunos; os educandos que atende são provenientes da classe média e, portanto, oriundos de famílias que vêm sofrendo com constantes crises econômicas que assolam o país, levando-as a perda do poder aquisitivo e, conseqüentemente, ocasionando uma diminuição do número de discentes nas escolas privadas 3. Contudo, tendo presente a realidade em que trabalho, não fico atrelada apenas a esse contexto de estudo, mas busco investigar educadores e educandos envolvidos em outros cenários educacionais, que também são foco de minhas observações. 2 No texto utilizo o termo fazer escolar como sinônimo de prática pedagógica, usando os dois, indistintamente. 3 Fonte consultada para tal afirmação: documento AEC/RS-2004 Análise de Conjuntura Relação escolas/congregações/ SINEPE

Ao participar de seminários e congressos, muitos realizados pela AEC-RS, não posso deixar de fazer minhas indagações frente às diferentes situações problematizadoras, que se descortinam ao longo do tempo de minha pesquisa. Reconheço, nestes espaços, cenários significativos para ajudar a entender meu tema de pesquisa. Um encontro importante foi o XXVII Seminário Estadual de Educação da AEC-RS, que aconteceu nos dias 16/17 de outubro de 2003, onde foi abordado o tema O Saber e o Conviver na Prática Educativa. Neste encontro, discussões em grupos foram realizadas com o intuito de pensar a educação. Como faço parte da equipe pedagógica desta associação, que planeja as dinâmicas de trabalho, tive a oportunidade de sugerir a pergunta que foi o centro dos debates: Quais os desafios do saber e do conviver 4 na prática educativa? As considerações dos grupos, formados por professores, de escolas católicas e públicas, presentes no final deste trabalho, fornecem elementos essenciais para a redação da dissertação. As mesmas contribuem enormemente com dados significantes que ajudam a pensar a problemática da educação. As discussões em torno da educação na AEC-RS são enriquecedoras nas análises conclusivas que aqui apresento. Porém, os dados obtidos estão inclusos e expressos em minha fala na medida em que, ao me apropriar dos mesmos, escrevo o presente trabalho, expondo as reflexões analíticas. Educadores e educandos de outros espaços escolares contribuem para o entendimento do problema de pesquisa. Entrevisto professores de escolas estaduais, como Instituto de Educação Flores da Cunha do Estado do 4 Entendo por conviver o contato constante entre pessoas e/ou grupos que vão estabelecendo relações através do convívio.

RS, Escola Estadual Paulo da Gama e professores de colégios particulares católicos tais como Nossa Senhora do Rosário, São José e Bom Conselho. São foco de meu estudo os protagonistas da prática escolar, ou seja, sujeitos envolvidos no ensino-aprendizagem, tais como equipes diretivas, professores, alunos, pais e mães, pois considero que, apesar da dificuldade de lidar com tantos dados, todos fornecem elementos significativos que contribuem para a interpretação e a busca de respostas para o problema de pesquisa. As entrevistas e observações são os recursos metodológicos que melhor se adequam à minha proposta de trabalho. Redijo minha dissertação apresentando conclusões resultantes da análise e da compreensão que tive dos resultados obtidos. As interpretações que faço são decorrentes do que percebo neste momento da pesquisa. Contudo, não pretendo absolutizar minha opinião expressa. A mesma está aberta ao diálogo que possa contribuir para um melhor entendimento e problematização do papel da escola e da pesquisa nela possível. Procurando captar a dinâmica do fenômeno educacional e a realidade do dia-a-dia escolar, utilizei a técnica da observação como auxílio para entender o papel desempenhado pela escola na educação brasileira. Ludke e André fazem a seguinte afirmação em seu livro sobre pesquisa qualitativa em educação: Usada como o principal método de investigação ou associada a outras técnicas de coleta, a observação possibilita um contato pessoal e estreito entre pesquisador e fenômeno pesquisado, o que apresenta uma série de vantagens. A experiência direta é, sem dúvida, o melhor teste de verificação da ocorrência de um determinado fenômeno (Ludke, André, 2001, p. 26). Conforme estas autoras, a técnica da observação permite que o pesquisador cheque, mais de perto, a perspectiva dos sujeitos na medida em que o observador acompanha, in loco, as experiências diárias dos sujeitos, e, com isso,

se pode apreender a sua visão de mundo, isto é, o sentido que eles atribuem à realidade que cerca a si e às suas ações. Assim, a observação é minha principal técnica para a coleta de dados, onde, em diferentes momentos da vida escolar, observo o seu cotidiano. Meu olhar é direcionado para a sala de aula (espaço físico tradicional), para as relações que se estabelecem no pátio, nas reuniões pedagógicas e administrativas, na sala dos professores, nos corredores e nas reuniões com os pais, mães e/ou responsáveis pelos discentes. Enfim, em diferentes situações que oportunizam o olhar da observadora para responder os questionamentos de pesquisa. Para superar obstáculos, procuro trabalhar através de uma perspectiva crítica e de um permanente repensar, buscando, em minha prática, a valorização do diálogo. Não pretendo com isso a neutralidade, mas sim exprimir o respeito às diferenças de idéias e posições, mantendo um olhar crítico sobre meu próprio percurso de pesquisa. Busco manter viva a curiosidade e a procura por respostas para entender a razão de ser dos sujeitos em estudo. Para tanto, mantenho presente o contexto histórico no qual a escola está inserida e os instrumentos ideológicos que permeiam não apenas a escola, mas também a sociedade em que o sistema educacional do Brasil está submerso, dificultando um outro fazer. Faço minhas observações buscando fundamentação teórica pertinente ao tema da pesquisa, considerando a totalidade do contexto educacional, levando em conta fatores históricos, políticos e sociais para o entendimento e a compreensão do problema. Pretendo, também, ficar atenta às expressões e sinais não verbais para a compreensão e a validação do que é efetivamente dito. Busco a analise e a interpretação dos discursos à luz de uma linguagem que permite

confrontar com outras informações da pesquisa, identificando a ideologia que permeia as falas dos sujeitos. Considero certas informações, aparentemente isoladas e discrepantes, importantes elementos na elucidação das questões estudadas. Detalhes, muitos deles subjetivos, tais como gestos, ações, expressões e reações, contribuem para ajudar na análise das categorias. São elementos ricos na medida em que se convertem em aspectos pertinentes aos propósitos de estudo. Para isso, levo em conta a afirmação de Patton (1980) que diz: O esforço de detectar padrões, temas e categorias é um processo criativo que requer julgamentos cuidadosos sobre o que é realmente relevante e significativo nos dados. Para tanto, procuro despender um esforço no sentido de valorizar e integrar as informações importantes. Tendo presente minha realidade, não desconsidero os dezessete anos de trabalho no Colégio Glória, onde sou parte atuante do todo da escola. Sendo assim, utilizo minhas aulas de Sociologia, ministradas nos segundos anos do Ensino Médio, para, através do diálogo com e entre os alunos e da observação, colher dados significativos ao estudo. Os discentes das turmas em que trabalho, têm aproximadamente 16 anos de idade, sendo que a grande maioria corresponde a faixa etária considerada favorável para este grau de ensino. Partindo dos objetivos propostos na disciplina para o ano letivo de 2003, desenvolvi dinâmicas articuladas, possibilitando aos discentes momentos para pensarem a respeito dos fenômenos sociais e refletirem sobre teorias e ideologias que alimentam o senso comum no seio da escola e fora dela. Dentre as dinâmicas, os seminários e os debates foram as principais técnicas desenvolvidas em aula, onde, através de indagações, provoquei a discussão em torno de temas geradores necessários ao entendimento da situação social brasileira.

Como a disciplina de Sociologia foi ministrada em um ambiente de estímulo ao diálogo e ao embate de opiniões, se tornou um campo rico para a identificação dos problemas da escola e suas dificuldades para enfrentar os desafios da educação na superação do senso comum. As informações pertinentes são registradas, num primeiro momento, em folhas de ofício e, posteriormente, transcritas para um caderno de anotações de campo, organizado especialmente para a pesquisa. O teor das mesmas está expresso nas falas dos sujeitos e nas conclusões que apresento ao longo do texto. Para tanto, considero categorias essenciais para coleta e análise dos dados. Estas categorias são: escola (obstáculos e desafios do fazer escolar) e a relação no desempenho de seu papel com a educação, política, mercado, trabalho e conhecimento. Ambas servem como referência na elaboração do instrumento utilizado nas entrevistas feitas com professores e alunos. Entrevistas semi-estruturadas são realizadas com alunos, (na faixa etária de 16/17 anos) do terceiro ano do Ensino Médio do Colégio Glória. Eles respondem as indagações (oral ou por escrito) partindo da liberdade de expressão sem um esquema rígido de questões. Transcrevi para o caderno as informações obtidas, selecionando-as conforme o conjunto de palavras-chave significativas à dissertação. Apresento, no final do presente trabalho, a folha que ilustra a abordagem das entrevistas, utilizada para o entendimento do problema em foco. Ao recolher os dados, registro considerações a partir do que é percebido durante os questionamentos. Isto faz com que a linguagem sublinear seja levada em conta na análise final da pesquisa, não se perdendo durante o itinerário da investigação. Todos os nomes citados ao longo da dissertação são fictícios, ou seja, são identificações criadas para preservar a identidade das pessoas que

contribuem com dados para a pesquisa. Obtenho das mesmas autorizações que me permitem expor o teor das indagações que faço, mas considero prudente não mencionar seus nomes. A única pessoa que identifico com o nome real é o professor Táurio Brand, presidente da AEC-RS, por reconhecer em sua fala posicionamentos de grande relevância na área da educação. Como trabalho também nas sextas e oitavas séries, na mesma instituição, lecionando as disciplinas de História e Geografia, tenho a possibilidade de direcionar meu olhar para diferentes níveis e faixas etárias, buscando evidenciar, através das expressões oral e escrita, como os sujeitos, ao longo dos anos de estudo no mesmo colégio, e, ao chegarem ao ensino médio, constroem seu pensamento, superando ou não formas e concepções de mundo ocasional e desagregado. Procuro com isso entender até que momento a escola contribui para a formação humana, derrubando ou reproduzindo práticas discriminatórias, favorecendo ou dificultando a edificação de um ambiente próprio para a construção de uma nova visão crítica de mundo, condizente com um projeto políticopedagógico transformador. Tento compreender até que ponto a escola se torna um espaço capaz de intervir na consciência dos educandos, na qual os mesmos possam captar o movimento de humanização e desumanização que imperou e impera na trajetória histórica do Brasil. Investigo sobre o quanto a escola possibilita um pleno desenvolvimento dos alunos, munido-os de instrumentos capazes de fazê-los pensar, refletir, entender e vincular os processos formadores e deformadores da prática social que se estabelece no seio da sociedade brasileira.

Assim, busco compreender o quanto ela se movimenta para avançar de conteúdos programáticos e de uma metodologia tecnicista de reprodução de saberes acumulados para uma educação que estimule o pensamento crítico, fazendo com que o aluno cresça em consciência e perceba situações onde se realizam as precárias condições humanas que deformam e desumanizam o ser. Penso que minha inserção no campo de estudo e os anos de trabalho como educadora são de extrema importância, na medida em que me dão subsídios para pensar a respeito dos fazeres da escola e também são tempos investigadores que me fazem identificar problemas, levando à busca de respostas capazes de esclarecer as dificuldades da práxis escolar em superar velhos métodos de ensino. Minha experiência na área da educação ajuda-me a tentar entender o cenário no qual os diferentes sujeitos sociais interpretam seus pensamentos, sentimentos e ações. Portanto, o meu processo educativo é um terreno fértil ao qual recorro para ajudar a compreender o significado das manifestações do comportamento humano, levando em conta o maior número possível de elementos presentes nas situações estudadas. Todavia, canalizo minhas indagações exclusivamente àquilo que considero pertinente ao tema e procuro confrontá-las com os novos dados que são obtidos pelas técnicas de pesquisa a que me propus. Através do contato direto e constante no dia-a-dia escolar, mantenho uma preocupação contínua com o processo, procurando à luz de um quadro teórico fundamentação que oriente a interpretação dos dados. Analiso, através das falas e dos discursos proferidos no cenário da escola, de que forma os protagonistas do processo educativo vêem as relações

entre teoria e prática, assim como as implicações destas perspectivas na sua prática pedagógica. Procuro identificar os obstáculos da escola e até quando ela assume o desafio de derrubar e destruir formas inúteis de trabalho, os quais dificultam um verdadeiro aprendizado, avançando para uma metodologia capaz de libertar de preconceitos nocivos, que emperram um novo fazer, contribuindo para a formação de sujeitos críticos que possam intervir na realidade e auxiliar na edificação de uma sociedade nova. Este trabalho é um recorte da realidade educacional do Brasil e uma tentativa de entender os obstáculos e desafios da prática escolar. A partir destas informações, pretendo compreender as contradições e conflitos pertinentes à prática educativa, no intuito de buscar uma sistematização do conhecimento que foi obtido com a pesquisa teórica e de campo e sua contribuição para a compreensão do problema e a possível troca com outros pesquisadores e professores da escola.

2.3 Cenários expressivos de vida, do conviver e educar-se O objetivo deste capítulo é fazer uma reflexão a respeito do papel da escola enquanto espaço que se propõe a assumir o compromisso com a educação. Mesmo intitulando-se como principal cenário onde ocorre o processo educativo, a escola não é o único lugar onde as pessoas se educam. Outros cenários, que fazem parte da vida humana, também participam do processo de formação e educação dos sujeitos. Lugares diferentes, onde transitam as pessoas, podem ser transformados em locais educativos. São os espaços onde se desenvolve a trama social e política a partir das relações que se configuram em determinado momento histórico. A educação é um processo permanente e inerente ao viver, ou seja, na medida em que vivemos em diferentes situações, estamos nos educando. O dia-a-dia é educativo, pois os indivíduos vão criando e recriando formas de vida social. Diante disto, é necessário questionar o tipo de educação que queremos

ajudar a construir e que homens e mulheres temos a intenção de formar no cenário da escola. Para Brandão (2001) quando o educador pensa a educação, ele acredita que, entre homens, ela é o que dá a forma e o polimento. Mas ao fazer isso na prática, tanto pode ser a mão do artista que guia e ajuda o barro a que se transforme, quanto à forma que iguala e deforma. Nas palavras de Brandão, não existe um modelo único de educação, embora o pensamento dominante tente nivelar todos através de um padrão que não respeita culturas e divergências. Ela também pode servir para a manutenção da situação vigente, como pode ser um espaço que faça germinar a rebeldia em um meio condicionado à reprodução. A educação pode ocorrer em diversos lugares de prática social. Ela existe sob formas diversas e, inúmeras vezes, é encoberta ou parece invisível. O olhar normalizador só a reconhece nos espaços abertamente destinados à educação familiar e formal da escola. É forte a idéia difundida pelo senso comum que atribui a maior parte da tarefa de educar à escola. Impera este pensamento principalmente na sociedade que espera da instituição de ensino uma formação integral dos indivíduos. Este olhar sobrecarrega a escola e não consegue perceber outros cenários da sociedade que também são educadores. A idéia de que a escola é o palco principal de educação e formação está presente na fala dos alunos do terceiro ano do Ensino Médio, quando questionados a respeito do papel do espaço escolar. A escola integra os alunos para que eles saiam com estudo, sendo pessoas íntegras (Maiara).

Querendo ou não, a escola tem um papel muito importante da educação. Hoje a educação não vem mais da família, mas sim da escola, pela falta de tempo que os pais têm para com seus filhos (Fernando). A escola, para mim, tem o papel de ensinar, preparar e educar os alunos para a vida, tornando-os bons profissionais e boas pessoas. Falando em aspecto de educação pessoal (atitudes pessoais, modos e costumes) a escola tem um papel fundamental, pois as crianças e os adolescentes passam boa parte de suas vidas nela, e a escola precisa educá-los, pois sem educação adultos tornam-se fracassados na vida (Rodrigo). A escola deve educar seus alunos em todos os sentidos em que apresenta a palavra educação, que vai desde a escolaridade até o comportamento (Regina). Pode-se dizer que o principal trabalho da escola é completar a educação familiar dos alunos (Rodrigo). Escola ensina uma boa educação para sabermos nos comportar fora da escola, para o mundo (Kátia). A escola é como se fosse uma segunda casa para nós, passamos parte do dia nela, até nos apegamos a ela. A escola nos ensina desde o início da nossa vida, crescemos nela e nos educamos dentro dela (Tânia). A educação para a vida, como mais da metade da vida é colocada numa escola, então a maior parte da educação que será usada em vários aspectos da vida vem dela (Marta). Nas falas dos alunos é forte a idéia de que a escola é o cenário mais importante para o processo educacional dos indivíduos. É dela a carga maior no sentido do educar. Afirmações tais como: a escola é responsável por formar pessoas íntegras, a educação vem da escola, a escola prepara para a vida, a escola deve educar em todos os sentidos, a escola completa a educação familiar demonstram o peso que é atribuído a esta instituição como espaço principal na formação educacional. É inegável o importante papel que a escola exerce na formação das crianças e dos jovens. Ela é significativa no processo educativo dos sujeitos que

a integra. É no ensino formal que a educação se condiciona a um projeto pedagógico fundamentado por uma pedagogia que orienta o fazer docente, oportunizando ou não situações para a aplicabilidade prática do ensino. Frente a isto, ela constrói seus métodos e regras que se constituem em propostas e caminhos a serem percorridos conforme a realidade que se apresenta, sofrendo forte influência das constantes crises sociais que provocam alterações na vida dos seres humanos. Na vida moderna, com a crescente imposição das exigências dos valores capitalistas, o núcleo familiar vem sofrendo grandes transformações. A família tradicional está perdendo o espaço para outras formas de organização familiar. O pai não se constitui mais no único chefe da família e como único provedor dos recursos para a sobrevivência dos membros que a compõe. Hoje, a mulher, ao sair para o mercado de trabalho, vem ao longo dos últimos anos transformando o antigo caráter familiar onde a mãe permanecia em casa e, por isto, permanecia física e emocionalmente ao lado dos filhos. Com o crescimento acelerado dos hábitos de consumo e com a mercantilização de todos os bens necessários à sobrevivência humana, as famílias necessitam dispor de grande tempo para colocar sua força de trabalho nos espaços apropriados como únicos pelo capitalismo. Isto gera uma sobrecarga para as famílias que possuem filhos, principalmente o elemento feminino, que, tendo que dar conta dos afazeres domésticos e do trabalho, muitas vezes abdica dos cuidados consigo e com a prole. É desumanizante a excessividade de tarefas, as quais as pessoas assumem para poder sobreviver frente às exigências que o modelo socioeconômico impõe. Isto se manifesta nas falas dos pais e mães de alunos quando afirmam: