A musica popular e formada pela mistura de quais sons

A musica popular e formada pela mistura de quais sons

Você já reparou a diversidade de ritmos da Música Popular Brasileira? Há estilos musicais para todos os gostos, as letras são criativas e por isso é conhecida internacionalmente. Esses são motivos de sobra para voltarmos ao passado, ver como tudo começou e como evoluiu nossa música…

A música popular brasileira surgiu a partir de uma mistura de ritmos vindos dos europeus, africanos e indígenas, mas é entre os séculos XVI e XVIII que ela começa a tomar forma, a partir do crescimento das cidades e da necessidade de haver entretenimento e expressão popular. Surge assim os dois primeiros ritmos musicais que marcaram a história da MPB: o lundu , de origem africana, com batidas fortes e ritmadas e a modinha , de origem portuguesa, com tom melancólico, sempre abordava temas românticos com batidas calmas e característica erudita. No final do século XIX , surge o Choro ou Chorinho , a partir da mistura do lundu, da modinha e da dança de salão europeia.  Marcando essa fase, em 1899 , surge a cantora Chiquinha Gonzaga que compõe a música “Abre Alas”, uma das mais conhecidas marchinhas carnavalescas da história.

No início do século XX , pela mistura de ritmos dos morros e cortiços do Rio de Janeiro, surge a mais popular entre todos os etilos musicais de nosso país: o samba!  No ano de 1917 o cantor Ernesto dos Santos, o Donga, compõe o primeiro samba chamado “Pelo Telefone”. Ainda no mesmo ano, aparece a primeira gravação de Pixinguinha, importante cantor e compositor de nossa música. O samba-canção , que é um gênero do samba, surge um pouco depois, no final de 1920 centrado em temáticas de amor, solidão, representando o contraponto do samba ritmado da época. Dentro desse mesmo estilo, outros cantores também começam a se destacar: Dolores Duran, Antônio Maria, Marlene, Emilinha Borba, Dalva de Oliveira, Angela Maria e Caubi Peixoto.

Nas décadas de 1920 e 1930 ocorre a popularização do rádio e os cantores da época ficam cada vez mais conhecidos e alguns cantores se destacam: Ary Barroso, Lamartine Babo - criador de “O teu cabelo não nega”, Dorival Caymmi, Lupicínio Rodrigues e Noel Rosa. Surgem também os grandes intérpretes da música popular brasileira: Carmen Miranda, Mário Reis e Francisco Alves.

Na década de 1940 , a música regional do nordeste começa a contagiar o país através de Luis Gonzaga, surgindo o baião , ritmo que ficou popular através desse cantor. O baião retrada o cenário da seca do nordeste. Algumas de suas músicas são conhecidas até hoje: “Asa Branca” e “Assum Preto”.

No final da década de 1950 , outro estilo chega a todo vapor: a bossa nova , um estilo sofisticado e suave. Por ela a música brasileira começa a ser mais conhecida no exterior. Os principais cantores da Bossa Nova são Elizeth Cardoso, Tom Jobim e João Gilberto.

A televisão é outro meio de comunicação que ganha espaço tornando-se cada vez mais popular e, em meados da década de 1960 , começa a influenciar também a música brasileira, principalmente pela iniciativa da TV Excelsior, que levou ao ar a primeira edição do festival da Música Popular Brasileira e da TV Record, que ficou responsável pelas edições seguintes. Nestes festivais são lançados nomes da música brasileira que se tornaram verdadeiros ídolos daquela geração e das seguintes, pois são populares até hoje. Entre eles estão: Elis Regina, Chico Buarque de Holanda, Caetano Veloso Milton Nascimento e Edu Lobo. Também nessa época, a TV Record lança o programa musical Jovem Guarda e cantores Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa começam suas carreiras de sucesso.

Ao falar de música popular brasileira, é impossível deixar de lembrar do Tropicalismo , movimento que surgiu entre 1967 e 1968 liderado por Gilberto Gil e Caetano Veloso. Como já vimos, na época predominavam no Brasil dois estilos: a MPB e a Jovem Guarda, que estavam em constante conflito.

Os dois cantores quebraram a disputa criando um cenário musical que misturava a canção nacional ao rock, com letras de forte cunho político e roupas espalhafatosas, feitas com plástico e plumas, entre outros materiais.

Um dos grandes acontecimentos que marcou o nascimento da tropicália foi a apresentação das canções “Alegria, Alegria” e “Domingo no Parque”, apresentadas respectivamente por Caetano e Gil no 3º Festival de MPB da TV Record, em 1967.

Um ano depois, os cantores junto com Gal Costa, Tom Zé, Os Mutantes, Nara Leão, o maestro Rogério Duprat, Júlio Medaglia, Damiano Cozzella, Torquato Neto e Capinan lançaram um disco coletivo recheado de canções-manifesto chamado “Tropicália”. Neste mesmo ano, Gil e Caetano foram presos e mandados para o exílio pelo governo militar, fazendo com que o movimento perdesse força.

Pela influência desses grandes cantores, na década de 1970 , vários músicos brasileiros começam a fazer sucesso, vindos de todas as partes do país: Nara Leão grava músicas de Cartola e Nelson do Cavaquinho. Diretamente da Bahia, Gal Costa e Maria Bethânia fazem sucesso nas grandes cidades. O mesmo acontece com Djavan, de Alagoas, Fafá de Belém, chega do Pará, Clara Nunes de Minas Gerais, Belchior e Fagner, ambos do Ceará, Alceu Valença de Pernambuco e Elba Ramalho da Paraíba são os principais. Também nessa época o rock brasileiro começa a apontar nas paradas de sucesso, com Raul Seixas e Rita Lee. Representando o funk aparecem Tim Maia e Jorge Ben Jor.

Com forte influência de estilos musicais vindos do exterior, nas décadas de 1980 e 1990 novos estilos musicais começam a apontar no Brasil, assim começa a geração do rock , do punk e da new wave. No Brasil, acontece a primeira edição do show Rock in Rio , no início dos anos 80, que ajudou a impulsionar o rock nacional. As músicas tinham temática variadas, circulando entre questões sociais, juvenis e amorosas. Neste período surgem várias bandas musicais: Paralamas do Sucesso, Legião Urbana, Titãs, Kid Abelha, RPM, Plebe Rude, Ultraje a Rigor, Capital Inicial, Engenheiros do Hawaii, Ira! e Barão Vermelho. Também fazem sucesso: Cazuza, Rita Lee, Lulu Santos, Marina Lima, Lobão, Cássia Eller, Zeca Pagodinho e Raul Seixas.

A música sertaneja ou country começa a ganhar espaço nos anos 90 , com um forte caráter romântico, surgem no cenário musical Chitãozinho e Xororó, Zezé di Camargo e Luciano, Leandro e Leonardo e João Paulo e Daniel. Também nesta época, no cenário do rap destacam-se: Gabriel, o Pensador, O Rappa, Planet Hemp, Racionais MCs e Pavilhão 9.

O século XXI começa com o sucesso de grupos de rock com temáticas voltadas para o público jovem e adolescente e os principais músicos são Charlie Brown Jr, Skank, Detonautas e CPM 22.

O mais interessante é que os vários estilos circulam pacificamente entre as gerações e cada gênero musical vai servindo de referência para as gerações futuras, criando essa sinfonia harmoniosa que é a Música Popular Brasileira!

Curiosidades

Poucos sabem, mas existe Academia Brasileira de Música, fundada por Heitor Villa-Lobos, em 14 de Julho de 1945. A instituição cultural fica no Rio de Janeiro, tem como característica o fato de ser sem fins lucrativos e é composta de 40 acadêmicos, personalidades de destaque no meio musical brasileiro nas áreas de composição musical, interpretação e musicologia.

O lundu tem uma proveniência adversa. Sabe-se que deriva da musicalidade dos negros de Angola e do Congo, que levaram para o Brasil a sua tradicional dança da umbigada (semba, em quimbundo). No século XIX, o português Alfredo de Morais Sarmento descreveu uma dança “essencialmente lasciva”, capaz de reproduzir os “instinctos brutaes” dos povos africanos. Segundo o viajante: “Em Loanda [...], o batuque consiste também n’um circulo formado pelos dançadores, indo para o meio um preto ou preta que depois de executar vários passos, vai dar uma embigada, a que chamam semba, na pessoa que escolhe, a qual vai para o meio do circulo, substitui-lo”. (SARMENTO, 1880, p. 127). É certo que essa dança a qual Sarmento se refere, de nome “batuque”, foi a mesma que chegou ao Brasil com os negros escravizados. No Brasil, aliás, “batuque” se tornou um termo genérico para denominar todas as manifestações dos negros e com toda a certeza é dessa manifestação que se originaram muitas outras práticas dos negros, inclusive o que depois foi chamado de “lundu”. Mas, o poeta Tomás Antônio Gonzaga, que viveu não somente em Minas Gerais, mas também na Bahia, durante sua juventude, chega a mencionar tanto o batuque quanto o lundu no mesmo poema, dando a ideia de formas diferenciadas (GONZAGA, 2013, p. 500):

“Aqui lascivo amante sem rebuço

À torpe concubina oferta o braço:

Ali mancebo ousado assiste e faia

À simples filha, que seus pais recatam.

A ligeira mulata, em trajes de homens,

             Dança o quente lundu e o vil batuque”

A umbigada se encontra presente em praticamente todas as danças de origem africana existentes no Brasil, incluindo o lundu. Segundo Carlos Sandroni:

“No lundu todos os participantes, inclusive os músicos, formam uma roda e acompanham ativamente, com palmas e cantos, a dança propriamente dita, que é feita por um par de cada vez. [e completa] [...] A ‘umbigada’ é o gesto coreográfico que consiste no choque dos ventres, ou umbigos [...]. Em traços gerais, elas consistiam no seguinte: todos os participantes formam uma roda. Um deles se destaca e vai para o centro, onde dança individualmente até escolher um participante do sexo oposto para substituí-lo (os dois podem executar uma coreografia – de par separado – antes que o primeiro se reintegre ao círculo). (SANDRONI, 2001, pp. 64-84).

Até mesmo por tribos indígenas a umbigada foi incorporada e, devido a sua lascividade, José Ramos Tinhorão (1972) chegou a dizer que a umbigada é uma “representação dramática de um jogo amoroso capaz de conduzir ao clímax sexual”. Também por isso, por ser considerada lasciva e chula, a dança dos negros chegou a ser proibida no Brasil, mas foi justamente sua languidez que despertou enorme apreço em muitos colonos, a ponto de começarem a praticar o lundu em seus festejos. Desta forma, aos poucos o lundu se tornou a primeira manifestação originada entre os negros a ser aceita pela sociedade branca da colônia.

A musica popular e formada pela mistura de quais sons

    Figura 1: A dança do lundu, Moritz Rugendas, 1835.

A musica popular e formada pela mistura de quais sons

Figura 2: A dança do lundu, também de Moritz Rugendas, 1835.

De fato, houve uma maior aceitação do lundu do que outras manifestações dos negros da colônia, especialmente as religiosas, os chamados “calundus”. “Kalundu”, aliás, é visto como aportuguesamento de “Kilundu” (do quimbundo) que para o angolano António de Assis Júnior, em seu Dicionário de Kimbundo-Português, significa “Espírito.| Ser do mundo invisível.| Magnetismo”, correspondendo ainda à cerimônia de chamamento desses espíritos. O termo “lundu” pode ter origem nesse termo “calundu”, o que ocorreu não só no Brasil, mas também Angola.

Não obstante, o interesse pelo lundu foi tamanho que ele não se restringiu apenas às fronteiras coloniais, sendo também incorporado à modinha (o que facilitaria sua aceitação na metrópole) e depois levado a Portugal.

A musica popular e formada pela mistura de quais sons

Figura 3: Representação do lundu na cidade de Lisboa, conforme gravura de Sketches of Portuguese Life, de A. P. D. G., sob o título Begging for the Festival of N. S. D'Atalaya (1826, p. 284)

Não se sabe se o introdutor do lundu em Portugal foi o mulato brasileiro Domingos Caldas Barbosa (mesmo introdutor da modinha em solo luso) ou, como sugere José Ramos Tinhorão, em Os Negros em Portugal, se foram os aventureiros portugueses que regressaram a Portugal com seus baús cheios de ouro, depois de enriquecer na colônia durante o período da mineração, a chamada “corrida do ouro”. Mas o fato é que também o lundu, tal como a modinha, foi eruditizado em Portugal, tonando-se uma dança de salão, já bem diferente daquela praticada pelos negros nos terreiros e com a umbigada devidamente disfarçada em mesura, como ressalta Mozart de Araújo (1964).

Em inícios do séculos XIX, Carl Philipp von Martius e Johann Baptiste von Spix presenciaram a prática do lundu também na Bahia, durante agradáveis jantares: “Nesses jantares, aparece no fim um grupo de músicos, cujos acordes, às vezes desafinados, convidam ao lundú, que as senhoras costumam dansar [sic] com muita graça.” (MARTIUS; SPIX, 1938, vol. II, p. 293). Os viajantes também coligiram espécimes musicais durante suas viagens, entre eles dois lundus, Uma Mulata Bonita e o conhecido Landum, incluídos no anexo de seu Reise in Brasilien, ou Viagem pelo Brasil.

O lundu também despertou especial interesse nos autores de teatro, tanto em Portugal quanto no Brasil, integrando entremeses e teatros de revistas, onde sua sensualidade servia bem para o teor cômico-jocoso das peças. Sobre esta questão, Rui Vieira Nery também nos chama a atenção para o caráter histriônico da poética dos lundus:

“Tanto as descrições literárias como as reproduções iconográficas mostram que o lundum era originalmente dançado de forma extremamente sensual pelos escravos africanos, com um típico balanceio em que os corpos dos bailarinos se tocavam regularmente à altura do ventre (a chamada umbigada), numa nítida sugestão do acto sexual. Escusado será dizer que o lundum de salão tinha por certo um carácter mais comedido, mas os poemas – que muitas vezes continham palavras e expressões idiomáticas em criolo – estão quase sempre recheados de subentendidos e jogos de palavras de natureza sensual que são por vezes hilariantes (em Esta Noite, Ó Céus, que Dita, de José Francisco Leal, por exemplo, o rapaz declara que nunca esquecerá ‘o ardor das pimentinhas’ do ‘guisadinho’ que lhe foi servido pelo seu ‘benzinho’..em sonhos, é claro).” (NERY, n.p., grifos do autor).

Entretanto, músicos eruditos consagrados e tidos como sérios como Carlos Gomes e Villa-Lobos também compuseram lundus.

Alcançaram grande popularidade os lundus Lá no Largo da Sé, de Cândido Inácio da Silva, Lundu da Marrequinha, de Francisco Manoel da Silva, Eu não gosto de outro amor, do Padre Teles, Onde vai Senhor Pereira Morais, de Domingos da Rocha Mussurunga, e Os Beijos do Frade, de Henrique Alves de Mesquita.

Com o advento dos fonogramas, o lundu foi o primeiro gênero musical gravado no Brasil, sendo o lundu Isto é Bom, de Xisto Bahia, interpretado por Bahiano, o primeiro registro fonográfico brasileiro, gravado em 1902. Entre finais do século XIX e inícios do século XX, o lundu foi cedendo espaço para o maxixe, especialmente nas representações dos teatros de revista, por isso o lundu é considerado pai do maxixe e, consequentemente, avô do samba, mas podemos, de uma forma geral, ao lado da modinha (avó), chamá-lo de avô de toda a música popular brasileira.

Referências Bibliográficas:

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GONZAGA, Tomás Antônio. Cartas Chilenas [edição eletrônica]. São Paulo: DCL, 2013.

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SANDRONI, Carlos. Feitiço decente: Transformações do samba no Rio de Janeiro, 1917-1933. Rio de Janeiro: Jorge Zahar/UFRJ, 2001.

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