O que é representatividade negra

Com certeza você já deve ter escutado, lido a respeito ou mesmo visto sobre a representatividade negra. Esse é um assunto que tem ganhado cada vez mais força em nossa sociedade, especialmente por conta da internet, e que traz uma proposta simples e direta: mudar o presente para que todos nós, sem distinções, tenhamos um futuro melhor.

Entretanto, há pessoas que não estão 100% familiarizadas com o tema, não sabem ao certo como contribuir ou têm dúvidas a respeito. Já alguns, por outro lado, gostariam de saber como torná-lo algo regular na própria rotina para apresentá-lo de maneira prática e didática à garotada.

Pensando nisso, preparamos um post especial com a ajuda da escritora e psicanalista Elisama Santos para discutir e explicar tudo a respeito dessa questão. Acompanhe e saiba mais!

O que é representatividade negra?

Elisama Santos explica que representatividade negra é “a reconstrução da imagem do negro na nossa sociedade“. Isso porque vivemos em um meio em que a cor da pele ainda importa e produz diferenças marcantes em como as pessoas são retratadas não só na mídia e no mercado de trabalho, mas no imaginário popular.

E não, não estamos falando de uma parcela pequena da população, mas da maioria dos cidadãos brasileiros. Um levantamento de 2019 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que 56,2% da população se identifica como negra ou parda.

Apesar disso, como pontua a escritora, quando fazemos um exercício simples de imaginação sobre indivíduos em carreiras de destaque, por exemplo, associamos automaticamente a figura deles a sujeitos brancos.

Já quando pensamos em indivíduos numa atividade de serventia ou mesmo na criminalidade, infelizmente, relacionamos eles a sujeitos negros. Isso é fruto direto da influência da escravidão no país, período que durou mais de três séculos e que moldou a forma dos brasileiros se relacionarem entre si, enraizando preconceitos e atitudes discriminatórias na sociedade.

Portanto, a representatividade negra — que surge com os movimentos negros não só no Brasil, mas no mundo — busca romper com essa imagem negativa frequentemente direcionada à população não-branca, com os estereótipos que insistem, como cita Elisama, “em sustentar que é normal que na escola do meu filho não tenha nenhuma professora negra, nenhum colega negro”.

A representatividade negra vem para combater os discursos que invisibilizam, segregam e marginalizam pessoas apenas por conta da cor, permitindo, assim, que os negros também possam se enxergar em diferentes lugares, ocupando-os e sendo bem-sucedidos. Ela vem, portanto, para promover a igualdade racial.

Qual é a importância da representatividade negra no desenvolvimento das crianças?

Elisama diz que é durante o desenvolvimento infantil que os pequenos aprendem a decifrar o mundo e, acima de tudo, o meio social em que vivem. A turminha é apresentada ao lugar das coisas e das pessoas na vida. “A criança aprende desde cedo para que serve um copo ou um lápis até quem são os indivíduos que a servem nos lugares, quem são os sujeitos que alcançam posições de poder”, explica.

Portanto, quando ela não tem contato com a representatividade negra em nenhum momento da infância, a criança passa a formar uma imagem mental baseada em preconceitos. Uma visão distorcida que vai levá-la a se tornar um adulto que enxerga apenas a si mesmo, muitas vezes incapaz de ter empatia e entender a dor do outro.

A psicanalista reforça que a representatividade é muito importante para que as crianças cresçam reconhecendo a diferença e entendendo que o mundo não é 8 ou 80. Ao contrário, ele é plural e cheio de diversidade. “É essencial que a gente ensine as crianças a verem as cores das pessoas — e não, isso não é ruim. Ruim é a gente achar que cor define caráter, capacidade“.

Esse processo de enxergar as cores é necessário para que elas tenham a capacidade de distinguir situações em que os estereótipos aparecem e são reforçados. Para que percebam que não há um único padrão de beleza e de inteligência ou que só uma parcela da sociedade é que tem acesso às possibilidades de realizarem sonhos e conquistarem as coisas.

“Representatividade negra na infância é pensar na construção de um entendimento de mundo que precisa abarcar mais do que apenas a semelhança da criança com os outros. É fazê-la entender que ela também tem lugar na transformação do mundo“.

Quando começar a falar sobre representatividade com os pequenos?

Esse é um assunto que pode ser abordado desde o início da infância — e não obrigatoriamente precisa começar com uma conversa. Ele pode se fazer presente na sua rotina com a criança por meio de ações. Afinal, atitudes falam mais do que palavras, ainda mais para os pequenos que ainda não têm o domínio da comunicação verbal.

Seja o exemplo para seus filhos, convivendo e interagindo com a diversidade, desde as pessoas que frequentam a sua casa até os profissionais a quem você recorre (como médicos, dentistas, advogados etc.). “Isso tudo é importante para que a gente viva aquilo que prega, para que não fique só em um discurso bonito, mas raso”, diz Elisama.

A partir dessas ações que nos aproximam naturalmente do tema se torna mais fácil discutir sobre negritude e racismo com as crianças, respondendo, sem medo ou desconforto, as dúvidas que elas trazem à medida que entendem que as pessoas são diferentes e que isso não é nenhum desmerecimento.

Como inserir a representatividade negra no dia a dia das crianças?

Elisama responde essa questão: “a gente insere representatividade vivendo essa representatividade”. É conversando e discutindo com a garotada sobre diversidade e como “as questões raciais não interferem apenas na vida da população negra, mas na dinâmica de toda a sociedade“.

É trazendo referências negras positivas e valiosas que ajudam você a se informar sobre o assunto e a compartilhar esse aprendizado com os mais novos. Em paralelo, também conta aquilo que você e as crianças consomem no dia a dia para se entreter, se divertir e aprender. Há vários recursos disponíveis, como:

  • livros infantis escritos por autores negros e/ou com protagonistas negros;
  • filmes rodados por diretores negros e/ou com protagonistas negros;
  • programas de TV que representam a negritude sem estereótipos;
  • brinquedos que mostram indivíduos negros como super-heróis, atuando em diferentes profissões e que valorizam a imagem negra.

Em resumo, a representatividade negra é muito mais do que um conceito, é uma necessidade urgente da nossa sociedade, com a qual todos podemos contribuir no dia a dia por meio de medidas simples na educação e no lazer infantis, focando a integração, o respeito e a valorização da imagem negra. Por isso, faça a sua parte, se inspire nas nossas dicas e contribua para, juntos, construirmos um futuro de igualdade.

Gostou de saber mais sobre a relação entre brinquedos e representatividade negra? Aproveite para conferir todas as nossas opções de bonecos e bonecas que celebram a diversidade!

Confira também outras dicas de brinquedos e conteúdos infantis, produzidos por marcas independentes de empreendedores negros:

Clubinho Preto

É um clube de assinaturas de conteúdo infantil, para crianças, famílias e educadores, com a missão de usar a educação como ferramenta para a construção de uma sociedade que respeite e valorize as diferenças.

Todo mês os assinantes recebem em casa uma caixa com 1 livro e 1 surpresa. Os conteúdos são selecionados por especialistas, que avaliam e selecionam conteúdos com que apresentem a Negritude de forma positiva, com protagonismo negro, e que valorizem a história e a cultura afro-brasileira.

Amora Bonecas

Amora é um negócio social que oferece materiais lúdico-pedagógicos para uma Educação Antirracista, e a cada Amora vendida, um outro brinquedo afirmativo é distribuído gratuitamente para escolas públicas.

No e-commerce deles é possível encontrar bonecas e bonecos de pano, caixa de giz com variados tons de pele, livro de colorir para crianças, mochilas, quebra-cabeças, jogos afro-históricos, acessórios, entre outros itens.

Loja Aneesa

Loja Aneesa é um e-commerce especializado em bonecas negras idealizado pela Josi. A criação da loja partiu da escassez de opções de bonecas pretas no mercado. Hoje a loja trabalha com fashion dolls de criação própria, a Aneesa, bonecas bebês, e também Barbies negras e Kens negros.

Elisama Santos é escritora e psicanalista. Autora dos best-sellers Educação Não Violenta (2019), Por que Gritamos? (2020) e Conversas Corajosas (2021), todos publicados pela Paz & Terra. Escreve e palestra sobre educação parental e sobre a construção de relacionamentos mais saudáveis e harmoniosos por meio da comunicação não violenta. Mãe de Miguel e Helena, compartilha nas redes sociais suas reflexões sobre maternidade, relacionamentos amorosos, pluralidade e o poder do diálogo. Acredita na empatia e na compaixão como poderosas ferramentas de transformação social.

O professor, cineasta e filósofo Rodrigo França acredita que faltam referências para crianças negras e que a ausência de representatividade no setor audiovisual é um problema a ser combatido.

Em entrevista na CNN Rádio, no quadro CNN No Plural, o autor de “O Pequeno Príncipe Preto” falou sobre o tema: “A população negra no Brasil é de 56%, quando vai no mercado de brinquedos, eles não chegam a 7% de traços negroides, como a criança negra tem um referencial para poder se espelhar? Se não consegue se enxergar em exemplos positivos?”

Ele explica que a representatividade nada mais é do que um processo de construção social. “Quando pensa no lúdico, se enxergar no audiovisual é a construção do que é bonito ou feio, o que tem confiabilidade e o que não tem.”

França admite que houve avanços, mas que eles não foram suficientes para um impacto necessário na sociedade.

Ele avalia que a educação de crianças precisa ser diversa, “é fácil para elas, não podemos subestimá-las, é necessário ensinar sobre subjetividade, que não existe um único padrão de beleza, de confiabilidade, precisa oferecer a diversidade”.

“Uma boneca negra é para a população branca também, oferece possibilidade, não coloco como exclusividade uma única raça, estou tirando uma única característica e colocando diversas”, completou.

Rodrigo França disse ter esperança de que a representatividade vai conquistar mais espaços nos próximos anos. “Tem uma garotada assumindo um legado de ratificar, se posicionar, em relação à diversidade, pautas que ficavam no universo da academia ou movimento negro, estão aí de maneira democrática e estão discutindo mais.”

“A gente precisa agir, a população negra está fazendo sua parte, as pessoas brancas que se colocam como antirracistas e aliadas, precisam assumir o lugar de privilégio e elaborar posicionamento concreto em relação a sua própria existência, todo mundo tem possibilidade de rever a posição na estrutura”, defendeu.

Assista também ao CNN Plural na TV: