Seu terrenos são mais baixos do que os terrenos ao seu redor


Page 2

Condamine e Lartigue procuraram

Lartigue procuraram com empenho encontrar a verdadeira causa do phenomeno. O primeiro d'estes infatigaveis geographos o attribue á disposição do fundo, e o segundo á differenca provavel dos niveis entre as aguas do oceano as do rio e no aperto repentino das gargantas em que as aguas se precipitam.

Qualquer que seja o peso d'estas razões, diz Montravell, não satisfazem ellas completamente o espirito. A explicação não convence.

E em verdade o que vemos parece objectar a uma e a outra. Dos estudos do illustrado Sr. de Ladario sabemos, em primeiro logar, que o taboleiro da fóz do Amazonas é por larga extensão inclinado insensivelmente para o mar, o que acontece na faxa da Guyana ; e, no entretanto, nem em todos os logares se percebe o phenomeno; e em segundo logar o

logar o mesmo Sr. Barão do Ladario presenciou 0 phenomeno em logares diversos, onde nenhuma garganta parecia querer fechar as aguas e detel-as.

Este illustrado escriptor sentio a pororóca no Maiacaré, no rio Uaçá, algumas milhas afastado da bahia do Oyapock. Além d'estes, foi mais observada a pororóca no Araguary e no Amazonas, nas proximidades da ilha Cruá antes do rio Araguary. No rio Cassiporé a 10 leguas da fóz bate a pororóca, como presenciou Aguiar Lima, que alli se achava em desempenho de elevado encargo. No Maranhão, conta-nos o Dr. Ennes de Souza, as pororócas invadem duas vezes por dia os rios Mearim e Pindaré; e Burnell nos dá as mais curiosas descripções das que invadem os rios Ganges, o Tamisa e o Severn.

Mas o que é a pororóca ?

Nas proximidades da lua nova, tres e quatro dias antes e depois, tempo das mais altas marés, o


Page 3

tempo, durante o qual ella ainda vasa nas costas do Norte, o nivel do mar deve ser mais elevado que n'estas ultimas paragens.

a No momento em que na costa do Norte a vasante se enfraquece e que a enchente prevalece, as aguas accumuladas do lado da ilha de Marajó dirigem-se com rapidez para o Norte da embocadura, para ganharem seu nivel. Ao mesmo tempo a corrente principal que vem do NE. ahi ajunta consideravel massa de agua e ambas estas causas produzem subita elevação nas aguas do rio, a qual de ordinario se estabelece sem grande agitação ; desde que, porém, algum obstaculo se oppõe ao escoamento das aguas, ellas dão logar á pororóca, que é tanto mais terrivel quanto com mais violencia sopram os ventos de .NE. ; por isso a pororóca no inverno é mais perigosa. »

Na noite de 9 de Abril de 1860, achava-se 0 de guerra Ibicuhy encalhado nos baixos da ilha de Cruá, quasi fronteirando a foz do rio Curijuba, quando foi assaltada pela pororóca, que causou serios estragos no navio, que abriu agnia.

Poude então o Sr. de Ladario medir com grande approximação a corrente da vaga que primeiro bateu no navio. Este felizmente estava com a linha da quilha na direcção da corrente que ella trouxe, de modo que assim offerecia-lhe menor resistencia.

Ouviu-se ás 11 horas da noite grande ruido que vinha de NE. e velozmente se approximava e com muito maior força. Tomou-se um chronometro de algibeira para que, notadas as horas em que a vaga batia na pôpa e salia pela proa, se pudesse deduzir a velocidade, pois qne era conhecido o espaço que devia percorrer.

Foi horrivel o embate; e não poderia ser de outro modo quando a vaga trouxe a velocidade de 19.6 milhas por hora!


Page 4

Bagharata, conta a lenda, tendo escolhido para esposa, entre as neves das montanhas azues, a divina Ganga, tomou-a nos braços e levando-a em seu carro fez que as rodas d'este traçassen as bordas do leito da Deusa. Chegados, porém, ás proximidades do mar, Ganga recuou espantada diante do impuro e monstruoso oceano e fugiu bruscamente por cem canaes que se lhe apresentavam em frente... Desde então, a Deusa luta para escapar ás garras amorosas do oceano...

Suspensa nos braços do amante, rolando o carro divino na estrada larga que lhe traçára o leito do rio sagrado, vai cautelosamente buscando escapar despercebida aos olhares do oceano... surprehende-a este e a Deusa volta de novo nos atropellos de uma fugida vertiginosa em busca das montanhas de neve que se escondem no azul...

-E teve assim origem a pororóca do Ganges... Conheceis bem, senhores, a historia das Amazonas.

Apolonio, segundo escriptor notavel, diz que as mulheres da ilha de Lemnos, habitação que foi dos antigos Sintios, fizeram em tempo perecer todos os homens.

Muito tempo havia que ellas não apresentavam offerenda alguma a Venus. A Deusa irritada as tornou aborrecidas a seus maridos, que abandonando-as pro

novos prazeres nos braços das escravas que captivaram, dissolando a Thracia. Mas, a que attentados não nos conduz o ciume? As mulheres de Lemnos assassinaram na mesma noite a seus maridos e rivaes e exterminaram até o ultimo dos varões, para que nem um sobrevivesse, que algum dia lhes pudesse impôr o castigo merecido por seu delicto.

Hypsipila só, a filha do rei Thoas, poupou o sangue de seu Pai, já maduro em

Fechou-o em um cofre e abandonou-o assim á mercê das ondas na esperança de que algum feliz acaso lhe salvasse a vida.


Page 5

« Manné ou Carapapori, no canal d'este nome; a 1°45' « quasi de latitude norte. « O limite, partindo do litoral seguiria o

curso do « acima indicado até sua fonte, depois se prolongaria a « igual distancia do rio Amazonas até encontrar o limite « oeste do Rio de Janeiro. »

Por parte do Brazil, o plenipotenciario respectivo declarou que, para pôr termo a questão por uma transacção, pondo o direito de lado, propunha para limite o rio Calsoene a 2°30' quasi latitude norte.

Não se chegando a accordo algum ficou a questão ainda por decidir ; o que fez o Sr. Coudreau dizer :

« Les negociations de 1856, n'ayant pas abouti, et « n'ayant pas été reprises depuis, les choses sont restées « dans le statu quo. »

Não foi tanto assim, é preciso reconhecel-o: pois que o Brazil continúa a reclamar, depois da importante obra do Sr. Dr. Joaquim Caetano da Silva, á qual o Sr. Coudreau nenhuma referencia entendeu dever fazer, o rio Oyapock como o. verdadeiro limite com a Guyana Franceza, embora o illustre viajante francez considere como limite official outra linha.

Com effeito ao concluir a primeira parte da sua memoria relativa á determinação do limite, que chama official, diz :

« As negociações tiveram ao menos em resultado dar « fronteiras officiaes ao territorio conquistado. »

Mas como ?

Referindo-se ás propostas feitas, em nome do seu governo pelo plenipotenciario francez, a França exigia, disse elle, sua fronteira historica, sua fronteira do seculo XVIII. Ella reclamava em 1856 :

« 1.° No litoral : o braço norte do Araguary, representa lo hoje (em 1887) pelo rio Jordão, o lago Macari,


Page 6

formation, moitié terre, moitié eau, un marais en croissance, non : la prairie est une zone achevée où tout est terre ferme, rivières courantes, et lacs d'eau vive. » Enfim : (...

Le colon pourra s'installer dans la prairie, avec un très petit capital et sans s'exposer à des maladies graves. »

Quanto ás tribus, refere Mr. Coudreau, é na região mencionada, entre o Oyapock e o rio Branco, onde se refugiaram as tribus do Amazonas, e cita nada menos de 30, algumas das quaes contam milhares de individuos, parecendo-lhe que se pode avaliar a população de todas em 100,000 almas.

Conclue a tal respeito nos seguintes termos : « Ceux qui savent tout le parti qu'il y a à tirer, dans l'Amérique chaude, de la race indigène — et pour l'acclimatement, par le metissage, de la race européenne, - et pour le developpement générale de la prospérité de la contrée

ne considereront pas comme la moindre attraction de ce territoire au sud des montagnes, territoire que commande l’Amazone comme le Piémont commande l'Italie, la presence de ces 100,000 indiens de ces 100 tribus vierges. »

O Sr. Coudreau não se limita a pretender presentear a França cem uma extensão de terras, que representa mais do dobro da superficie que a Guyana Franceza occupa realmente, dando-lhe posições, que dominem a entrada do grande rio, e que dominem a Amazonia como o Piemonte domina a Italia : vai ao ponto de repartir com a Inglaterra uma parte do que chama terreno contestado, como se pode ver na planta, que annexou á sua memoria no referido boletim da Sociedade de Geographia de Paris.

Eis em resumo quanto se colhe do trabalho do Sr. Coudreau.

Ora, além de que do exposto se reconhece que o Brazil desde os tempos coloniaes reclamou como fronteira sua o Oyapock, cedendo apenas uma ou outra vez diante da força, ou para pôr termo amigavel a uma questão internacional, e isso mesmo nunca de modo tão amplo como a França exigia, percebe-se que a conferencia do Sr. Coudreau teve por fim preparar o espirito nacional do seu paiz para entrar na posse de um terreno extenso, que só á força poderá ser separado do Brazil, porque lhe pertence de direito.


Page 7

« Eis o caracter distinctivo do trabalho, que tenho a honra de submetter á vossa apreciação.

« Será dividido em quatro partes :
« Na primeira lembrarei o que é o Oyapock.

« Na segunda darei a historia curiosa da questão do Oyapock.

« Na terceira exporei os motivos que a França allega em seu favor.

« Na quarta a demonstração de que taes motivos perdem a sua virtude diante das considerações, que os explicam, e que estabelecem entre a apparencia e a realidade uma harmonia até então desconhecida. »

Uma obra, assim desenvolvida, publicada em Paris, e na lingua franceza, não deveria ser posta de parte em uma conferencia que tem por titulo- Le contesté francobrésilien,

Felizmente o Brazil não parece disposto a ceder em tal assumpto a pretenções irrazoaveis, e pulsa ainda leal e fervoroso patriotismo no coração dos seus filhos, mesmo daquelles que por motivos politicos ainda estão exilados da patria.

Não sómente o actual governo brazileiro, segundo a imprensa annunciou ha dias, não tolerará negociação alguma sobre os terrenos áquem do Oyapock; o que certamente é acto de alevantado patriotismo; como tambem na Europa, o digno presidente honorario da Sociedade de Geographia do Rio de Janeiro e do Instituto Historico e Geographico Brazileiro, o Sr. D. Pedro de Alcantara, assim que teve noticia da conferencia apresentada á Sociedade de Geographia de Paris pelo Sr. Coudreau, dirigio, segundo refere o Jornal do Commercio de 7 de Outubro, uma carta ao Sr. de Quatrefages, presidente d'esta sociedade, e seu collega na Academia de Sciencias


Page 8

Por parte do governo francez foram nomeados dous plenipotenciarios successivamente: o Sr. Barão Deffawdis e o Sr. Barão de Rouen. Não concluiram cousa alguma. Trabalhou-se inutilmente desde Março de 1842 até Dezembro de 1844.

O imperio de Napoleão III tornou a entabolar negociações com o Brazil, e propôz novo arranjo. A 18 de

e Julho de 1853 começou a discussão em Paris. Foi plenipotenciario por parte do imperio sul-americano o inclyto Visconde do Uruguay, a quem, a 10 de Fevereiro de 1855, conferiram-se plenos poderes « para estipular, concluir e assignar um tratado que fixasse definitivamente os limites entre o Brazil e a Guyana Franceza. » A França confiou identica missão ao conselheiro de estado, Barão His de Butenval, o qual fôra ministro da França no Brazil. As negociações duraram de 30 de Agosto de 1855 a 1 de Julho de 1856, e não deram resultado algum effectivo.

Torna-se escusado referir outras negociações menos importantes, de que ter-se-ha uma idéa lendo a série de trabalhos a que tem dado logar o litigio no qual andaram mettidos até hoje os maiores estadistas de Portugal, da França e do Brazil, taes como Gomes Freire de Andrada, o Conde da Barca, D. Luiz da Cunha, o Conde de Ericeira, Mendo de Foyos Pereira, o Conde de Linhares, o Conde de Oriola, o Duque de Palmella, o Marquez de Penalva, o Conde de Porto Santo, o Visconde de Santarém, D. Francisco de Souza Coutinho; o Duque de Bro· glie, o Duque de Choiseul, o Principe de Conti, Claude e Gilbert de Orvilliers, Guizot, o marechal d'Haxelles, o Conde de Maurepas, o Conde de Molé, Polignac, os dous condes de Pontchartrain, Sartine, o marechal Soult, o Marquez de Torcy, o Conde Walewski, Thiers, e o Principe de Talleyrand; o Visconde de Abaeté, José Bonifacio, A. M. de Vasconcellos Drummond, Diogo Antonio Feijó, o Visconde de Itamaracá, J. F. Lisboa, o Visconde de Maranguape, o Visconde de Sepetiba, o Marquez de Olinda e tantos outros que é escusado citar aqui.


Page 9

e trancado na celeberrima prisão do Templo, a 4 de Ja- neiro de 1798.

A 6 de Junho de 1801 novo tratado, o de Badajoz entre Portugal, a França e a Hespanha, concedendo á

França as terras do cabo do Norte, desde o Oyapock

até o Araguary, limite imaginado por La Condamine.

Ao cabo de tres mezes e meio, mais um tratado o de Madrid, era concluido entre Portugal e a França, e assignado por intermedio de Carlos IV da Hespanha, concedendo á França, como limite, o Carapanatuba, em vez do Araguary. Não chegou o ser ratificado por qualquer das duas potencias.

Foi modificado por um artigo secreto das preliminares da paz entre a França e a Inglaterra, o qual dizia que « os territorios e possessões de S. M. Fidelissima ficariam mantidos integralmente », e que « os limites da Guyana Franceza e do Brazil ficariam sendo taes quaes haviam sido determinados pelo tratado de Badajoz. »

A 25 de Março de 1802, o tratado de Amiens dizia no seu art. 7.° : « Os territorios e possessões de Sua Magestade Fidelissima são mantidos na sua integra, taes quaes eram antes da guerra; todavia os limites das Guyanas franceza e portugueza ficam fixados no rio Arawari (Araguary), o qual se lança no oceano acima do Cabo do Norte, perto da Ilha Nova e da Ilha da Penitencia, cerca de 1° '), de latitude septentrional.

« Esses limites seguirão o rio Arawari, desde a sua foz mais remota do Cabo do Norte até á cabeceira, e depois uma linha recta tirada desde essa cabeceira até o rio Branco, da banda do oeste. Por conseguinte, a margem septentrional do rio Arawari, desde a sua ultima foz até á cabeceira, e as terras que se acham ao norte da linha dos limites acima indicados, pertencerão soberanamente á Republica Franceza. A margem meridional


Page 10

a Inglaterra serviria de intermediaria para um arranjo amigavel.

Foi esse o ultimo tratado sobre o assumpto, que, como se vê, deu logar a 24 tratados, sem adiantar cousa alguma para a solução irrevogavel do litigio !

C Actos bellicos. Mas a questão do territorio contestado entre a França e Portugal não foi ventilada tão somente nas chancellarias. Mais de uma vez deu logar a sangrentos conflictos, a verdadeiros actos bellicos, que principiaram no fim do decimo setimo seculo e que continuaram até os nossos dias.

Em Abril de 1697, o Marquez de Ferrolles, francoz, destruio as duas fortalezas portugueza do Desterro na foz do Pará, e do Toheré, na bifurcação do Amazonas, e estabeleceu um destacamento francez na de Macapá. Em Junho desse mesmo anno,

os valentes Portuguezes Francisco de Souza Fundão e João Moniz de Mendonça tornaram a recuperar Macapá.

Em Junho de 1822, os Francezes apoderaram-se de Moribira, na ilha das Guaribas, perto da cidade do Pará, e um navio francez foi ancorar no porto de Belém. João Paes do Amaral conseguiu, logo depois, rechaçar de Moribira os Francezes. Desejando colher novos louros, mesmo Amaral partiu para outra excursão não menos arriscada, e 'em Outubro de 1723 chegou á foz do rio de Vicente Pinson, em terras francezas, allegando que pertenciam a Portugal.

Em 1778 os Francezes estabelecem-se em Cunani, em 1783 no lago Macari. Informados dessa invasão em ,1791, os Portuguezes do Pará dão-se pressa em expulsal-os nos annos de 1793 e 1794.

No começo deste seculo a Guyana Franceza esteve

mãos portuguezas. De 1 de Outubro de 1808 a 14 de Janeiro de 1809 Paraenses marcharam contra


Page 11

vista do espectador ; deite o leitor sobre toda essa exotica natureza a côr local dos tropicos, e terá uma idéa do que é essa região. Coudreau alli encontrou, em mocambos ou quilombos, uma população brazileira fugitiva, composta de escravos fugidos e de soldados desertores, a qual alli vive de pesca e de commercio, socegada, pacifica e feliz, sem chefes, sem leis e sem governo, realizando o « ditosa condição, ditosa gente ! » de Camões. Os indigenas desappareceram.

Dos primitivos senhores do sólo, mal encontram-se vestigios : cemiterios, subterraneos, urnas funerarias e cinerarias, tão numerosas e esplendidas como difficeis de transportar intactas. Coudreau, que só tinha como companheiro um mulato de Cayenna, conseguiu, todavia, recolher alguns notaveis especimens ceramicos, que remetteu ao governo francez.

Seguiu para Belém do Pará pela Apurema, pela colonia de Pedro II e por Macapá, e, depois de descançar durante dous mezes na capital paraense, partiu para Manáos, no intuito de estudar systematicamente toda a região situada entre o Rio Negro, o Atlantico, o Amazonas e a cadeia central. Começou pelo Rio Negro.

B. De Manhos aos confins da Guyana pelo Rio Negro, pelo Haupés e os seus affluentes da esquerda. Sahido de Manáos no principio de Janeiro de 1881, , Coudreau só regressou á mesma cidade lá para fins de Junho. Desta vez tinha comsigo, além do seu primeiro

. companheiro, um joven botanico, o Sr. Roche, seu patricio, com quem travara relações no Pará.

A expedição subiu o Rio Negro até Santa Isabel, ultima escala dos vapores da companhia do Amazonas, e de la seguiu em canôa pelo grande rio, estudando os affluentes da esquerda, com especialidade o mais importante dentre elles, o rio Padauiry, até que, vingando as famosas cachoeiras de S. Gabriel, chegou á bifurcação do Haupés. Coudreau passou um mez no meio dos indios Haupés, onde reuniu dados originaes com que edificou uma nova explicação originalissima acerca da lenda das Amazonas, e onde colheu documentos para esteiar a sua doutrina de uma fronteira tupy-caraiba, idéa pessoal que traz elementos desconhecidos para a these franceza.


Page 12

duas potencias procurariam assignar um arranjo, compro mettendo-se, de antemão, a sujeitarem a questão a arbitramento se, porventura, não pudessem entender-se directamente.

() momento é propicio. A França anda á procura de um territorio colonial para collocar os reincidentes que, em boa hora, quer expulsar do seu seio. A' philantropia da maioria republicana repugna atirar esses homens a terras inhospitas. Os proprios representantes da Guyana recusam o dom fatal que se lhes quer fazer. Pois bem ! Ha um meio para a França de achar já um sitio para os seus reincidentes : na propria Guyana, na parte do territorio contestado, que o Sr. Visconde de Uruguay, propunha que se cedesse aos Francezes como limite extremo - existem campos ferteis, sadios, quentes, mas não humidos, em que poderão viver honestamente esses degredados. A França tem, portanto, razões especiaes para entrar em accórdo immediato 'comnosco.

O que acabo de escrever já é conhecido nas altas regiões politicas desta terra Ha de ser ainda mais conhecido depois da proxima discussão da lei dos reincidentes na camara dos deputados, para onde voltou o projecto, emendado pelo senado. Consta-me até que o honrado Sr. Franconie, representante da Cayenna no parlamento francez, fallará nesse sentido.

Para o nosso Brazil, quem ha que não enxergue as vantagens de uma solução immediata e amigavel! O Sr. D. Pedro II colheria a gloria de pôr um remate a um litigio secular; a provincia do Pará, a do Amazonas – essa sumptuosa Amazonia, que vive olvidada, inquieta, descontente, onde fermentam germens de separação, tal é o desgosto que lavra entre todos, perante a indifferença do su para com os interesses mais vitaes do paiz - veriam desapparecer receios de futuras complicações; a


Page 13

aquella população verdadeiramente sujeita aos costumes e ao governo da Guyana Franceza.

Um facto, porém, torna-se digno de estudo, e é o que se refere á facilidade com que se faz o commercio de contrabando entre Cayenna e alguns pontos da costa do Estado da Pará.

Muitas canôas fazem constantes viagens da Vigia, de S. Caetano, da costa norte de Marajó e mesmo de Macapá e do Araguary, conduzindo para Cayenna gado, alguma borracha e outros productos do Estado do Pará ! Os tripolantes e pilotos destes barcos já sabem que ao chegarem em Cayenna, dizendo que são do Amapá, têm immediatamente franca communicação com a terra, sem o menor embaraço, nem da parte da policia do porto nem do fisco, como se viessem de um ponto qualquer da propria Guyana Franceza.

Se, porém, um barco chega, dizendo que vai de Belém, capital do Pará, fazem logo toda a sorte de exigencias e surgem mil difficuldades, capazos de deses perar o mais paciente dos viajantes.

Ora, este commercio faz-se em escala consideravel, sendo lesados os cofres do Thesouro, não só na exportação como na importação.

Um fazendeiro de gado houve que fazia constante exportação para Cayenna, tendo allium contrato com o fornecedor militar da cidade ; recebia o preço da venda do gado em moeda franceza e depois vinha, quando tinha cambio conveniente, trocar os francos em Belém.

Para bem comprehender-se como andam estes negocios na costa norte da Republica não hesitamos em declarar que este fazendeiro era um funccionario publico, remunerado pelos cofres do Brazil.

Mas, quando mesmo não se quizesse cuidar de acautelar estas riquezas, a questão de limites, que temos com


Page 14

sobre a velocidade das tempestades, em numero de 197. M. Schönrock verificou uma velocidade de quasi 46 klm. por hora, com variações, indo de 21 a 80 klm.

Ellas foram menos velozes no verão que no inverno.

As mais velozes partiram do so., do 0., e do NO. As do oeste, depois de augmentarem a medida que caminhavam para léste, diminuiram depois de uma longitude de 30° a 35o. A LINGUA FRANCEZA NO EGYPTO.

Nota-se que a lingua franceza no Egypto corre

o risco de passar a segundo plano. Em 1889, sobre 18 escolas do governo, 15 ensinavam a lingua franceza e 3 a ingleza: hoje a lingua ingleza foi introduzida nas 15 escolas da franceza, e esta não o foi nas 3 daquella.

Em 1889, seguiam o ensino do francez 2,500 alumnos, e o do inglez 800 : hoje a proporção mudou; o numero de alumnos da lingua franceza não mudou, e

o da in gleza excedeu já de 2,000.

A situação é quasi a mesma nas escolas livres : ao passo que nas escolas congreganistas e leigas francezas aprendem a lingua franceza 9,500 alumnos, aprendem a ingleza mais de 8,000.

A Revue Scientifique a tal respeito assegura que, na matricula proxima, os papeis serão invertidos, e a lingua franceza apparecerá somente em segundo plano.

CONGRESSO GEOGRAPHICO DE ROCHEFORT. Em 3 de Agosto do corrente anno abriu-se o Congresso de Geographia de Rochefort, sob a presidencia honoraria do Ministro da Marinha, representado pelo Capitão Goulet. M. Milne Edwards, do Instituto, delegado da Sociedade de Geographia de Paris, tomou a presidencia effectiva.

Foram representadas 17 sociedades de geographia por meio de delegados.


Page 15

Officio do governador do Amazonas, Dr. Ximeno Villeroy, de 14 de Julho ultimo, respondendo a outro em que a Sociedade de Geographia solicitava as suas ordens para que fosse enviada alguma expedição aos rios S. Manoel e Paranatinga em procura dos exploradores brazileiros Capitão Antonio Lourenço Telles Pires e Oscar de Miranda.

() officio é do theor seguinte : « Accuso a recepção do vosso officio sob o numero 119 de 7 de Junho ultimo, a que respondo.

« Tenho empregado todos os meios de que disponho para alcançar noticia dos Capitães Antonio Lourenço Telles Pires e Oscar de Almeida Miranda, mas infelizmente têm sido baldadas as minhas diligencias. Ha dous mezes pedi permissão ao governo para mandar uma lancha de guerra em soccorro dos nossos consocios.

« Foi logo satisfeito o meu pedido.

« A 9 de Junho partio d'aqui a lancha n! 1, levando a seu bordo o Capitão José Soares de Souza Fogo, a quem incumbi d'essa diligencia, munido de instrucções e recursos proprios para o bom exito da exploração.

« Consta officialmente que o Capitão Fogo deixou a lancha na confluencia do S. Manoel com o Tapajós, subindo o primeiro, conforme lhe ordenei, em canõus afim de poder transpór as cabeceiras d'aquelle rio.

« 0 Capitão Fogo é um sertanejo experimentado e resoluto, e espero que elle desempenhe satisfatoriamente a commissão que lhe confiei.

« Ainda não desesperei da salvação de vossos bravos companheiros.

« Creio que elles foram obrigados a interromper a sua viagem por causa da estação chuvosa, invernando


Page 16

O expediente consta do seguinte:

Offertas de varios numeros da Gazeta do Sertão, Deutsche Zeitung, Goyaz, O Publicador Goyano, Trabalho, O Brucil (Parahyba.; Revue Geographique Internacionale, La Geographie, Le Brésil Républicain, L'Etoile du Sud, Le Brésil, L' Epoque Moderne; revistas da Sociedade de Geographia de Toulouse, Commercial de Paris, de Bordeaux, du Havre, Sociedade Real de Geographia d'Anvers e do Observatorio Meteorologico de Villa Colon.

Tomo XX do Instituto Polytechnico Brazileiro.

Relatorio dos trabalhos da commissão de estradas es trategicas no estado do Paraná pelo Capitão Belarmino A. de Mendonça Lobo.

Officio da commissão constituida em Paris para erigir um monumento á memoria do explorador Camille Douls, rogando o concurso da sociedade nesse emprehendimento.

Fica sobre a mesa para ser tomado em consideração opportunamente.

Officio da direcção geral da Estatistica de Guatemala, accusando haver recebido o 1. boletim da revista do corrente anno.

Officio da Bibliotheca Publica Pelotense, solicitando a remessa dos boletins. Satisfaça-se.

Officio do director do Observatorio do Vaticano, Dr. P. Francisco Denza, communicando que este estabelecimento, em vista da protecção que lhe dispensa o sabio Pontifice Leon XIII, goza hoje de nova e florescente vida, e solicitando a remessa dos boletins.

Carta do secretario da commissão de organisação do S? Congresso dos Americanistas, sobre as reducções que os adherentes do mesmo congresso encontrarão nos preços das passagens a bordo dos paquetes para a Europa e nas estradas de ferro francezas.


Page 17

É lida e approvada a acta da sessão ordinaria de is de Setembro ultimo.

O expediente consta do seguinte :

Carta do Sr. Julio Marcon, de Cambridge, remettendo um exemplar de sua memoria Novas pesquizas sobre a origem do nome America, na qual dá conhecimentos sobre varios estudos que a tal respeito tem feito.

Carta do Sr. Vianna de Lima, Encarregado de Negocios do Brazil na Bolivia, enviando um exemplar do tomo 1. do Diccionario Geographico d'esta Republica, e outro sob o titulo Explorações e noticias dos rios do Norte da Bolivia.

Carta do Sr. Ariguel Peres, remettendo um exemplar da brochura - Noticias das moedas, e introducção dos metaes preciosos 1888 89 ; outro da brochura Noticias sobre a exportação em · 1888 89.

Carta do Sr. Dr. Joaquim Pires Machado Portella, solicitando a remessa dos ns. 3o e 4o de 1885 da Revista da Sociedade de Geographia do Rio de Janeiro para completar a collecção que o Archivo possue.

Carta do Sr. Visconde de Leopoldina agradecendo a sua nomeação de socio bemfeitor da sociedade, e presenteando-a com a quantia de 5009000.

Carta do Sr. Barão de Teffé participando haver recebido o officio em que a Sociedade o nomeia para servir na commissão brazileira junto ao Congresso dos Americanistas, e dando as razões pelas quaes não poude desempenhar esta incumbencia.

Do Sr. Visconde de Cavalcanti igual communicação.

Carta do Sr. Quatrefages, Presidente da Sociedade de Geographia de Paris, participando que foi designada a cidade de Berne para séde do proximo Congresso Internacional de Sciencias Geographicas.


Page 18

Mello, Coronel Dionysio Evangelista de Castro Cerqueira, Commendador Luiz Antonio Ferreira de Almeida, Dr. Urbano Burlamaqui Castello Branco, Dr. Newton Cesar Burlamaqui e Padre Castello Branco.

0 Sr. Presidente informa que, de accordo com a resolução tomada pela Sociedade, celebrou-se a missa pelo eterno repouso do intrepido explorador Capitão Antonio Lourenço Telles Pires, bem como em acção de graças por haver concluido a salvamento essa mesma exploração o Sr. Capitão Oscar de Miranda.

Propõe igualmente que se insira na acta un voto de agradecimento e louvor ao valente Capitão José Soares de Souza Fogo, a cuja boa direcção se deve o feliz exito da difficil empreza, que a si tomou, partindo de Mankos internando-se pelos rios Tapajós e S. Manoel em busca d'esta sempre lembrada expedição Telles Pires e Miranda.

Esta proposta é unanimemente approvada.

O Capitão Oscar de Miranda agradece estas provas de consideração, que lhe tem sido prestadas pela Sociedade de Geographia, sempre tão dignamente representada pelo seu Presidente, e pede que lhe sejam marcados dia e hora em que possa em conferencia publici dar conta dos resultados de sua viagem.

É designado para esse fim o dia 12 do corrente, ás 7 horas da tarde.

O Dr. Paula Freitas diz que inaugurando a Sociedade de Geographia os seus trabalhos no salão que lhe foi cedido pelo Ministerio do Interior para a sua bibliotheca e sessões, não pode deixar de manifestar o seu agradecimento ao Sr. Conselheiro Correia pelo facto de haver permittido que a Sociedade celebrasse as suas sessões durante mais de seis mezes no salão da Escola Barão do Rio Doce, sem despeza alguna de moveis, illuminação ou qualquer outra para a Sociedade; por isso propõe que se consigne na acta um voto de reconhecimento ao Sr. Conselheiro Manoel Francisco Correia, e que se confira á Escola Barão do Rio Doce a medalha de Beneficencia.


Page 19

selvagens não só os réos condemnados a degredo, como individuos, que se accommodassem com os indigenas, aprendessem-lhes a lingua e servissem no futuro de interpretes e intermediarios ?

Não poderiam alguns salvar-se da brutalidade antropophaga dos habitantes, posto que na maior parte lhes servissem de pasto e regalo nas suas festas horrorosas, em que cortavam aos pedaços os corpos dos prisioneiros, e alegremente devoravam-lhes as carnes !

Examinando os annaes, documentos e escriptos antigos, officiaes e particulares, conseguimos a prova de que bastantes europeos viveram tranquillamente entre os gentios, adoptaram-lhes os costumes selvagens e serviram posteriormente aos navegantes para conciliarem uns e outros, invasores e invadidos.

Deixando de enunciar quantos destes factos chegaram ao nosso conhecimento, e reduzindo as pesquizas ao Brazil e ao appellidado Caramurú, deparámos na collecção do illustrado geographo castelhano Navarrette, a primeira noticia extrahida da relação de Avila ; nella se affirma que em 1526, na Bahia de Todos os Santos, encontra o commandante da náo hespanhola S. Gabriel, um christão, que dizia que alli se perdera, com o navio em que estava embarcado, havia já quinze annos.

Segue-se na ordem chronologica a decada de João de Barros, asseverando que pouco mais ou menos no mesmo anno, Rodrigo da Cunha descobrira um Portuguez na Bahia, tão selvagem como os novos compatriotas e amigos que adquirira, e que naquellas terras escapara naufragando.

O roteiro de 1531, escripto por Pero Lopes de Souza, e publicado em nossos dias, confirma as anteriores narrativas.

Navegando sob o commando de seu irmão Martim Affonso de Souza, que fôra incumbido de expellir das costas e mares os piratas francezes, affirma que, ao desembarcar na Bahia de Todos os Santos, apparecera-lhe um portuguez chamado Diogo Alvares, que vivia, ha cerca de vinte e dous annos, em paz com os indigenas e que deu larga razão de tudo quanto podia então interessar aos Portuguezes.


Page 20

o acolheu benigna e fervorosamente, e lhe prestou navios em que regressasse para a Bahia, no proposito de facilitar e auxiliar as relações dos francezes com

os indigenas da terra, promover-lhes o commercio, e quiçá preparar-lhes a posse do continente. Depararia o episodio em alguma vaga legenda popular? Não parece mais provavel que aproveitou-se do que Gabriel Soares referira ácerca do castelhano da Parahyba do Norte, e applicou a Diogo Alvares o que lhe era peculiar? Não percebeu que seria impossivel que continuasse a viver pacifica e amigavelmente entre portuguezes quem tivesse de boa ou má vontade entretido relações tão estreitas com piratas como se reputavam então os francezes, e auxiliando assim os inimigos da patria ?

Copiaram-no unisonamente, e sem criterio e escrupulo, os subsequentes chronistas Brito Freire, Jaboatão, Berredo, Balthazar Telles. Adiantou-se ainda mais Sebastião da Rocha Pitta, nascido na Bahia, e autor da primeira historia do Brazil, escripta e publicada no seculo XVIII, obra aliás meritoria e preciosa sob varios pontos de vista : ornou Rocha Pitta o episodio com bastantes flôres de rhetorica, accrescentando-lhe novas e todas de fantasia.

Não é Diogo Alvares, no dizer de Pitta, um marinheiro ou homem rustico e desconhecido como se dizia, e menos um Gallego : sobe á categoria de nobre, nasce em Vianna do Minho, pertence a familia fidalga. Em França recebe honrarias dos reis, e Paraguassú, sua consorte, é baptisada com o nome de Catharina, tendo por madrinha a pia Catharina de Medicis, casada com Henrique II. Não se cria assim uma estirpe illustre, que gloria a patria e a familia !

Apropriado assumpto para romances e poemas! Não o desprezou o eximio poeta brazileiro Santa Rita Durão, em fim do seculo passado. Caramurú converte-se em personagem distincto, em protogonista insigne, em heroe respeitavel ; Paraguassú brilha a seu lado e correm após elle doudas de amor as gentias, ciumentas da que fôra objecto de predilecção. Brilha o episodio da morte de Moema, todo da imaginação do poeta, como via de valor mais primoroso. Encanta em geral o colorido derramado em tão pequeno poemeto, que honra, entretanto, e muito, o nome do autor e a litteratura patria !


Page 21

em fim do seculo passado. Caramurú converte-se em personagem distincto, em protogonista insigne, em heróe respeitavel ; Paraguassú brilha a seu lado e correm após elle doudas de amor as gentias, ciumentas da que fôra objecto de predilecção. Brilha o episodio da morte de Moema, todo da imaginação do poeta, como via de valor mais primoroso. Encanta em geral o colorido derramado em tão pequeno poemeto, que honra, entretanto, e muito, o nome do autor e a litteratura patria !

Resultou de todo esse ramalhete da legenda, que até nossos dias acredita-se em muitas das circumstancias fantasiadas, e que encontram-se em alguns compendios descriptas como historicas, illudindo assim os animos populares com erros prejudicialissimos.

Raciocinemos um pouco, e tudo desapparecerá como chimera.

Quando teve lugar a apregoada viagem de Diogo Alvares á França? Reinou em França desde 1499 até 1515 Luiz XII, casado com Anna da Bretanha; de 1515 a 1547 Francisco I, cuja consorte chamava-se Claudia : subio ao throno somente em 1747 Henrique II que esposou Catharina de Medicis.

Até 1547 o anachronismo resalta, porque não apparece rainha franceza appellidada Catharina.

Os documentos officiaes e todos os escriptos asseveram tambem que, naufragado Diogo Alvares, ao que elle proprio dizia, em 1510 ou 1511, encontrado em 26, 31 e annos seguintes na Bahia, ahi sempre permanecera e ainda fôra encontrado em 1548, ao tomar Thomé de Souza, conta do governo; nesse intervallo de tempo está provado que não effectuou viagem á França. Percebeu-o Rocha Pitta, e por isso imputou a viagem a annos pogteriores de 1548, no proposito de encontrar uma rainha Catharina em França. Está, no entanto, verificado que durante o governo de Thomé de Souza continuou sempre tambem Diogo a residir na Bahia, e ahi falleceu pouco tempo depois, deixando numerosa prole. Antes não se realizára o facto, e depois tornou-se impossivel. doeumentos e escriptos portuguezes que subsidiam e esclarecem a historia, nada resulta que preste o mais pequeno indicio á legenda.


Page 22

contacto do individualismo christão,

individualismo christão, que penetra de mais mais

imperio outrora fechado europeus.

« Estes emprehendimentos são tanto mais inquietadores quanto o progresso das industrias não mais permitte hoje a cada nação de limitar-se ao consumo de seus proprios productos e exige mercados de exportação.

« A que nos reduziremos quando a Africa, a America, a Asia e a Oceania fecharem-n'os as portas ?

« A Europa occidental succumbindo aos pés de uma dividida de 63 milhares, ficará reduzida á miseria e seus habitantes não terão outro recurso senão emigrar para os paizes mais favorecidos.

« Já o exodo pela fome começou. Se a França, graças ao seu clima maravilhoso e aos seus habitos de economia, poude resistir até aqui, muitos factos ecomicos parecem indicar que está proximo o momento em que terá ella de succumbir... A despeito do accrescimo da fabricação, as exportações diminuem : 4216 milhões em 1866, contra 4548 milhões em 1876, e 4281 milhões em 1886. Quanto ao movimento dos metaes preciosos, ás entradas de 511 milhões em 1866, 615 milhões em 1876, se transformaram em uma sahida de 136 milhões em 1888. Vivemos do nosso capital.

« Por intuição a opinião publica preoccupa-se d'este perigo e sob a impulsão das sociedades de geographia fundadas depois da guerra de 1870, a expansão colonial, o unico remedio pratico, toma um grande incremento; tendo nós a grande e boa fortuna de encontrar dous homens de estado, Mr. Gambetta e Ferry, que comprehendendo os verdadeiros interesses da França, dirigiram on iniciaram este movimento... Mas, se a concepção foi grandiosa, a execução deixa muito a desejar... Esperamos ainda pelos resultados... tendo, no entretanto, o


Page 23

paiz despendido centenas de milhões e perdido milhares de homens... Perguntamos uns aos outros para que tantos sacrificios ?

«Demos a palavra a geographia ; sejamos geographos e como geographos procuremos agir ; isto é, com discernimento; mas, o que é indispensavel é que o façamos, »

Eis aqui, senhores, a palavra de ordem da França actual, da França de 1891, e a origem dos rumores que de novo chegam aos nossos ouvidos e que nos fallam d'essa nova especie de guerra de conquistas - no ultimo quartel d’este seculo de luzes, que não é precisamente o de maiores glorias da França como potencia colonial ...

Leon Deschamps em sua recente historia da questão colonial em França, n’um transbordamento desculpavel de exagerado sentimento patriotico, diz que o exemplo da França tem determinado na Europa um gosto geral para as emprezas coloniaes. Graças a Mr. Ferry que for temente defendeu e seguiu a politica chamada de expansão, póde-se estimar hoje em um milhão e setecentos mil kilometros quadrados a superficie dos territorios annexados á França desde 1870; isto é, proximamente dous terços das actuaes possessões d'aquella nação.

No entretanto, não dirá uma heresia historica quem affirmar que o povo francez não ama as viagens, não cultiva a geographia. As descobertas do seculo 16. foram feitas sem a participação da França.

E porque assim seja; e porque a indole do seu povo é opposta em absoluto a conquistas do desconhecido, vamos nós hoje encontrar a França de olhares dirigidos para o Valle do Amazonas, renovando questões vencidas, mortas de ha muito e que só não foram terminadas officialmente por desleixo ou por desvios condemnaveis da diplomacia portugueza, da brazileira e da franceza.

E ainda por isso que nós vamos encontrar perdida em obra volumosa, como na densidade das florestas do grande Valle, esta phrase caracteristica de escriptor francez, e que se refere a quantos autores, em França, se tem occupado destes estudos :


Page 24

sem audiencia de Portugal dispozeram que o rei regente D. João VI entregaria a Guyana franceza até o Oyapock vem desde a foz d'este rio, na latitude norte 4° 13' 17" até o cabo do Norte, na latitude 1° 40' 15''.

Em geral, da foz do Amazonas até o Oyapock, a costa é baixa e alagada nas grandes marés.

Do Oyapock para Cayena o aspecto varia ; é montanhoso mesmo a tocar o mar.

0 litoral que consideramos é coberto de vigorosa vegetação de Xiriubas.

A altura media dessas arvores não é menor de 70 palmos (15",40 ). As que bordam os cabos Cassipore e Orange vão a mais de 100 palmos... ( 22",00 ).

A parte comprehendida entre o cabo Orange e a foz do rio Calsoene, tem a denominação de costa dos Mayés, pois que ali antigamente habitou uma tribu indiana d'este nome, que percorria de continuo o litoral desde o Marony, limite das Guyanas, a hollandeza e a franceza.

Na extensão do Amazonas ao Oyapock se nota apenas um ponto singular - o monte Mayés, nas proximidades

da foz do rio Cunani e na latitude norte de 2° 46' 10".

E um pequeno e frondoso outeiro, que mal se avista de 18 milhas quando se está ao nivel do mar.

No interior, porém, pelo paralello de 3o bem se avista uma serrania que divide as aguas dos rios que vêm ao oceano, ao sul do Oyapock das que vão ao Araguary, Carapanatuba, Jary e outros que se despejam no Amazonas pela margem esquerda.

Esta serrania termina na margem direita do Oyapock, pelas cabeceiras dos rios Curipi, Arucaná, afluentes esquerdos do Uaça, que sahe a bahia do mesmo Oyapock.

D'aquella serrania destacam-se tres montes que se avistam distinctamente


Page 25

o mar, em logares descobertos nas vasantes das marés grandes. N'este baixio vigorosa se ostenta a pororoca.

E' o baixio dos Sete dias, de Condamine.

O limite oriental do taboleiro que vem pela margem esquerda segue com ligeiras inflexões o rumo NI NO tirado da extremidade da ilha das Flechas, a 40 milhas ao mar, no paralello de 2° 10° norte. A parte sul d’este taboleiro e que offerece menos fundo, é só possivel a navegação de pequenas embarcações ; ainda assim evitam-n'a por causa das correntes e mares agitadas que geralmente incommodam os viajantes n'estas paragens.

A costa de Maracá é bordada de um parcel que vem do cabo do Norte á sua ponta SE, no paralello de 2o : o mar por ahi é agitado. Mas a 10 ou 12 milhas de distancia tem-se fundo não inferior a 45 palmos, sendo que vai

na linha que se dirige á ponta NE. da mesma ilha, já d’ella proxima.

D’ahi em diante com excepção do banco que sahe d'esta ponta a ENE, por tres milhas a parte norte de Maracá é limpa.

A costa desde o Amapá até o cabo Cassiporé, menos em frente as pontas salientes, distante d'ellas de uma a duas milhas, é limpa e de segura aproximação. Do Calsoene para Cunani augmenta 0

fundo nas mesmas distancias em mais de metade, até o paralello de 3° 15' ; de então até o Cassiporé essa linha de sonda de 45 palmos se abre para NNE., em virtude do banco que vem do rio do mesmo nome, de sua ponta extrema da direita.

Toda a costa do cabo Orange a 10 milhas ao largo, é de uma sondagem não menor de 40 palmos ; apenas cerca do paralello d'este cabo ha o banco que projecta a ENE. por 8 a 9 milhas. A linha de sonda da bahia do Oyapock entre este cabo e a montanha d'Argent é de 25 a 30 palmos. E este taboleiro vê-se muito ao mar inclinando-se para NNO., o que faz diminuta a sonda d'ahi para Cayena pela costa.


Page 26

Em seguida começou o orador perguntando quaes forão os primeiros homens que pisaram o sólo americano e observa que a historia não pode ainda e nunca poderá talvez responder a esta pergunta.

Referio-se depois ás transformações que se operaram na forma e configuração do continente americano, a flora e fauna daquellas épocas remotissimas, para vir depois discutir a questão da existencia do homem fossil na America, contemporaneo do mammuth e do mastodonte.

O orador observa como as descobertas do dinamarquez Lund, nas cavernas ossiferas da Lagoa Santa, em Minas-Geraes, estabeleceram a existencia desse homem fossil, de craneo longo e estreito, de glabella proeminente, e OS OSSOS molares salientes sobre os inferiores.

Pelo contrario, não está ainda estabelecido de onde vieram os elementos brachicefalios que penetraram, mais ou menos, na antiga raça de craneo alongado : questão ardua, resolvida de varias maneiras por ethnographos e anthropologistas, taes como Peschel, Morton Burbon, Telmdi, Humboldt, Pickering, Muffer, Bancroft, Dally, D’Orbigny, Ameghino, Topinard, De Quatrefages, Haing, De Vadaillac, etc.

Em summa, disse o orador, poder-se-hia suppôr que uma raça antiquissima, de craneo dolichocephalo tenha occupado alguma região da America, quer ao norte, como no centro, como ao sul, que

outra raça, de craneo brachicephalo tenha penetrado ulteriormente no Novo Mundo.

Pelo que diz respeito a esta segunda raça, parece verosimil que tenha sido de origem asiatica: teria penetrado na America pelo estreito de Behring em uma época que não se pode quasi determinar.

Quanto á primeira raça, aquella de que possuimos