O modo como cada sujeito estabelece relações com os outros indivíduos e com a cultura

ARTIGOS

Teorias da socialização: um estudo sobre as relações entre indivíduo e sociedade

Socialization theories: a study about the relations between individual and society

Maria Graça Jacintho Setton

Universidade de São Paulo

Correspondência / Contact

RESUMO

O artigo propõe uma reflexão na qual a interdependência entre as instâncias de socialização e os indivíduos faça-se presente. Com base em algumas formulações sobre a sociologia dos processos socializadores, empreende-se uma análise a fim de apreender a complexa dinâmica educativa da atualidade. Existe e é possível concretizar empiricamente a articulação de interdependência entre as matrizes de cultura? Como compreender o imbricado e conflituoso processo de construção das disposições de habitus? Identificando uma nova estruturação no campo da socialização, busca-se uma perspectiva relacional entre as agências a fim de apreender a especificidade do processo de construção das disposições de habitus do indivíduo contemporâneo. A partir dos conceitos de fato social total, de Marcel Mauss, e de hibridismo, do antropólogo latino-americano Nestor García-Canclini, formula-se a hipótese de que a cultura da modernidade imprime uma nova prática socializadora distinta das demais verificadas historicamente. Assim sendo, a discussão pretende contribuir para os estudos relativos aos processos socializadores nos âmbitos institucional e individual, bem como auxiliar no difícil procedimento de investigar a construção das disposições de habitus com base na observação cuidadosa dos mecanismos e das estratégias formadoras. Amplia a leitura sobre o alcance e o limite de cada uma das matrizes de cultura e, simultaneamente, permite perscrutar sobre o movimento de ascensão de novas agências socializadoras.

Palavras-chave: Socialização - Indivíduo - Sociedade - Fato social total - Configuração - Hibridação.

ABSTRACT

The article proposes a reflection in which the interdependence between instances of socialization and individuals can be made present. Based on some of the formulations about the sociology of socialization processes, an analysis is conducted with the purpose of apprehending the complex educative dynamics of the current times. Is there, and is it possible to actualize empirically, the articulation of the interdependence between the matrices of culture? How should we understand the intricate and conflicting process of construction of the habitus dispositions? Identifying a new structuring of the field of socialization, the text seeks a relational perspective between the agencies, in order to apprehend the specificity of the process of construction of the habitus dispositions of the contemporary individual. Based on Marcel Mauss's concept of total social fact, and on Latin American anthropologist Nestor García Canclini's concept of hybridism, the article puts forward the hypothesis that the culture of modernity establishes a new socializing practice distinct from the previous historical ones. In this way, the discussion aims at contributing to the studies related to the socializing processes within the institutional and individual spheres, as well as to help in the difficult task of investigating the construction of habitus dispositions on the basis of a careful observation of formative mechanisms and strategies. It therefore extends the reading on the reach and limit of each of the matrices of culture and, simultaneously, makes it possible to peer into the ascending movement of new socializing agencies.

Keywords: Socialization - Individual - Society - Total social fact - Configuration - Hybridization.

Il ne s´agit pas de professer un écletisme sociologique visant à tout réconcilier par oecuménisme, mais d´une necessité théorique, ou plus exactement, d´une conception même de la nature des faits sociaux. (DUBET, 2005, p. 11)

Esta reflexão é o retrato do amadurecimento de uma série de desdobramentos de pesquisa que contam aproximadamente vinte anos. Trata-se, ainda, da síntese de incursões reflexivas de parte do material coletado em pesquisas realizadas ao longo desse período. Grosso modo, deseja-se uma inflexão analítica acerca de um conjunto de aspectos relativos aos processos socializadores, em sua dimensão individual e institucional. No formato de um ensaio exploratório, busca-se uma reflexão teórica que auxilie na compreensão relacional do fenômeno do ponto de vista macroinstitucional das agências socializadoras, bem como pela ótica microestrutural, oferecendo um instrumental para explanações acerca do indivíduo socializado.

Identificando uma nova estruturação no campo da socialização, busca-se uma perspectiva relacional de análise entre as instâncias, a fim de apreender a especificidade do processo de construção das disposições de habitus do indivíduo na atualidade. Partindo dos conceitos de fato social total, de Marcel Mauss, e de hibridismo, do antropólogo latino-americano Nestor García-Canclini, formula-se a hipótese de que a cultura da modernidade imprime uma nova prática socializadora distinta das demais verificadas historicamente. Considera-se, pois, que o processo de socialização das sociedades atuais é um espaço plural de múltiplas referências identitárias. Ou seja, a modernidade caracteriza-se por oferecer um ambiente social no qual o indivíduo encontra condições de forjar um sistema híbrido de referências disposicionais, mesclando influências em um sistema de esquemas coerente, ainda que heterogêneo. Contudo, como se tece de maneira individual essa complexa rede de sentidos?

Em trabalhos anteriores, examinou-se a particularidade da configuração cultural no Brasil, desde aproximadamente a década de 1970. Considerou-se, primeiramente, a coexistência marcante de diferentes matrizes socializadoras na formação cultural do povo brasileiro, registrando duas temporalidades bastante distintas. Temporalidades estas ainda em curso que podem ser caracterizadas, grosso modo, pelos pares de conceitos tradicional/moderno, rural/urbano, cultura oral/cultura letrada (SETTON, 2004a). Em um segundo momento, focalizou-se a sinergia de esforços pedagógicos entre instâncias socializadoras - família (camadas populares), escola (cultura letrada) e mídia (cultura de massa) -, evidenciando-se um espaço intercultural de referências na composição de disposições de cultura de um grupo de estudantes das camadas pouco escolarizadas. Na ocasião, foi possível observar uma mistura ou mesmo hibridação entre referências escolares e midiáticas na construção de um novo capital cultural, sendo este específico dos segmentos populares (SETTON, 2005a).

Mais recentemente, a partir de uma perspectiva macrossociológica, realizou-se um estudo comparativo entre jovens provenientes de distintas configurações educativas. Os processos socializadores aqui analisados enfatizaram, em evidências estatísticas, disposições provenientes de muitas matrizes de cultura, despertando o interesse para a construção de sentido elaborada pelos sujeitos em suas vivências individuais (SETTON, 2009b).

No Brasil, sobre a cultura escolar, usando como referência as estatísticas educacionais, pôde-se observar que só muito recentemente se conseguiu universalizar o acesso à escolarização em todo o território. Segundo o Censo Demográfico de 2005, entre os brasileiros de 25 anos ou mais, um contingente expressivo não ultrapassou o ensino fundamental, e a média de tempo de estudos é sete anos; 23,5% continuam analfabetos funcionais e 11% analfabetos. Apenas 43,3% estudaram mais de oito anos.

Mais especificamente, se tomados os centros desenvolvidos como modelo, constata-se que as camadas médias têm pouca tradição em relação à cultura letrada (SETTON, 1994, 2004b). Grande parte dos segmentos médios possui apenas os primeiros anos da vida escolar, e, nesse sentido, tem poucas chances de sedimentar hábitos, práticas e comportamentos que valorizam as maneiras cultivadas de relacionar-se com a escola, tornando-a referência e base para suas escolhas relativas a um estilo de vida.

Raciocinando a partir das categorias de Pierre Bourdieu (1979) e Bernard Lahire (1997), pensa-se que o trabalho pedagógico da escola tende a ser mais valorizado e aproveitado desde que as condições de socialização sejam propícias. Isto é, considerando que a sinergia de projetos pedagógicos entre a família e a escola favorece um maior rendimento escolar, compreende-se o trabalho complementar entre ambas como um espaço significativo na consolidação de uma maneira de se relacionar com os valores e as categorias de julgamento propriamente cultivadas, as quais determinam sobremaneira a seleção e a priorização de práticas afinadas a uma cultura culta e letrada.

Por outro lado, é importante salientar que, dada a nova configuração das sociedades contemporâneas, a sinergia de forças entre família e escola é apenas uma possibilidade, longe de ser geral, ainda que desejada. Em condições de modernidade, o contato com uma heterogeneidade de referências culturais implica chamar a atenção para a formação de indivíduos plurais, na acepção de Lahire (2002, 2006). Ou seja, indivíduos submetidos a um conjunto de influências e experiências de socialização, distantes da família e da escola, indivíduos que podem apreender novos e/ou outros modelos de cultura, que competiriam com os tradicionalmente vistos como legítimos.

Nesse contexto, atenta-se para a presença das mídias e para o mercado de cultura construído com base nelas. No caso do Brasil, mais especificamente, desde os anos 1970, a sociedade vem convivendo com a realidade dos meios de comunicação de massa de maneira intensa e profunda. Pouco letrada e urbanizada, em algumas décadas, a população brasileira viu-se imersa em uma terceira cultura - a cultura da comunicação de massa -, que se alimenta à custa das culturas de caráter humanista, nacional, religiosa e escolar (MORIN, 1984). Sobre a matriz de cultura religiosa, cabe lembrar que, mesmo o Brasil tendo como religião majoritária o catolicismo, sabe-se que, desde a década de 1990, é forte a presença de evangélicos no país. Não obstante, religiões oriundas de uma fé mais mágica, como a umbanda e o candomblé, ou crenças de origem indígena, como a pajelança, ainda que veladas, participam do universo das crenças nacionais. É possível, pois, considerar a realidade brasileira como estando organizada com base em uma variedade de matrizes de cultura convivendo em tensas relações simbólicas, matrizes disposicionais capazes de orientar condutas, práticas e representações sociais ora coerentes, ora heterogêneas.

Preocupando-se em compreender as tensões e os enfrentamentos entre valores tradicionais difundidos, em tese, pelos espaços da família e da religião e valores modernos disponibilizados, quase sempre, pela escola e pelas mídias, propõe-se que esta discussão contribua para a compreensão das articulações e dos enfrentamentos numa experiência tanto individual, quanto institucional. Os desdobramentos desse tipo de discussão são múltiplos. O trabalho é extenso. De um lado, os resultados obtidos podem concretizar um esforço intelectual com base em uma ampla e complexa trama de sentidos entre as instâncias e os sujeitos. Ou seja, amplia-se o detalhamento de uma perspectiva teórico-metodológica, a saber, a interdependência entre indivíduo e sociedade ou entre estruturas mentais e sociais. Por outro lado, pode-se dar destaque ainda à operacionalidade da teoria no universo da empiria. Pode-se colocar em prática o evidenciar empírico da articulação entre as matrizes de cultura no processo de construção das disposições de habitus na contemporaneidade.

Justificativa da proposta

Objetiva-se aqui salientar o potencial analítico do conceito de socialização no campo da sociologia da educação contemporâneo. Tem-se como proposta apresentar o alcance e o limite de um conceito que, ainda que presente desde os primeiros estudos dessa área, aos poucos foi perdendo poder de uso em função de sua aproximação com as teorias estrutural-funcionalistas, bem como o simultâneo desaparecimento de sua capacidade de interpretar as transformações de ordem institucional nas sociedades atuais.

Nessas reflexões, além de ser concebida como uma noção definidora de um conjunto expressivo de práticas de cultura que tecem e mantêm os laços sociais, a socialização é entendida como uma área de investigação que explora as relações indissociáveis entre indivíduo e sociedade. Em sua dimensão produtora, difusora e reprodutora, a socialização pode enfocar as instituições como matrizes de cultura, enfatizar as estratégias de transmissão e, portanto, de transformação dos valores dos grupos sociais, além de explorar o processo de incorporação realizado pelos indivíduos ao longo de suas experiências de vida. Isto é, ela deixa de ser apenas uma noção de integração explicitamente vinculada a uma tradição sociológica para ser vista de modo mais abrangente, como um processo construído coletiva e individualmente e capaz de dar conta das diferentes maneiras de ser e estar no mundo.

Ademais, o processo de socialização pode circunscrever uma força heurística mais ampla do que a noção de educação ou de processo educativo. Se o último, na grande maioria das vezes, é considerado como prática intencional, consciente e sistemática, o processo de socialização tem a vantagem de agregar as noções anteriores a uma série de outras ações difusas, assistemáticas, não intencionais e inconscientes. Estas, adquiridas de maneira homeopática na família, na escola, na religião, no trabalho ou em grupos de amigos, querendo ou não, acabam participando na construção dos seres e das realidades sociais.

Para os interesses desta discussão, salienta-se ainda que, a partir dos anos 1980, um conjunto de trabalhos sistematizou contribuições significativas no campo das teorias sociológicas, e todos eles, de certa forma, questionaram o poder explicativo de paradigmas centrados unicamente nas estruturas ou nas determinações de ordem material e econômica. A necessidade de incorporar, nas análises sociológicas, a figura do agente social passa a dominar algumas correntes de pensamento, de maneira assistemática, porém bastante expressiva. Na tentativa de promover um debate sobre a teoria da socialização, alguns autores atualizaram certa imaginação sociológica, introduzindo novas abordagens acerca de um dos temas mais tradicionais da sociologia, como as relações dialéticas entre indivíduo e sociedade. Nesse sentido, as ponderações que seguem pretendem apontar uma compreensão mais complexa do conceito, abordando-o de maneira mais dialógica. É possível apreender que, num caminhar vagaroso, mas ao mesmo tempo decisivo, alguns autores auxiliam nessa travessia problematizando um tema e um objeto de análise que marcam o campo de investigação da sociologia da educação.

Em busca de uma sociologia relacional entre indivíduo e sociedade

Philippe Corcuff, em As novas sociologias: construções da realidade social (2001), propôs responder à seguinte questão: quais foram os conceitos mais discutidos nos anos 1980 e 1990 na França? Ele evidenciou convergências inéditas, ainda que não claramente percebidas, em pesquisas que têm pontos de partida e recursos conceituais diversos.

Segundo Corcuff, é possível identificar que alguns autores tentam superar antinomias clássicas (como objetivo e subjetivo, coletivo e individual ou micro e macro), as quais, mesmo que constitutivas da sociologia, deixaram de ser produtivas. Contra essas oposições, que se teriam tornado cada vez mais esterilizantes, desenhou-se um novo espaço de questões denominado por ele de construtivismo social, pois, de acordo com essas perspectivas, a realidade social tenderia a ser apreendida como construída e não como dada ou natural (CORCUFF, 2001).

Assim, a partir dos anos 1980, o campo da sociologia francesa não estaria fragmentado ou fracionado em visões opostas; ao contrário, perspectivas comuns poderiam ser identificadas. Essas novas maneiras de conceber o social seriam denominadas pelo autor como novas sociologias. E ele foi além: afirmou que, ainda que a tradição da sociologia tenha-se firmado trabalhando com vários pares de conceitos herdados da filosofia, ela se revelou particularmente marcada pela oposição entre sociedade e indivíduo.

Lembrando um dos paradigmas de uma vertente dessas oposições - Émile Durkheim e seus discípulos estruturalistas -, Corcuff assinala que, no clássico As regras do método sociológico (1978), a noção de coletivo ou social, distinto do individual ligado à psicologia, estaria na base da definição da sociologia; o coletivo remeteria à noção de constrangimento do universo exterior que, impondo-se aos agentes, teria um domínio de validade, no espaço e no tempo, ultrapassando consciências individuais. Dessa forma, a objetividade do mundo social teria uma consistência independente dos indivíduos que o compõem.

Numa rápida retrospectiva Corcuff (2001) afirma que a ênfase dada à proeminência do coletivo na compreensão dos aspectos sociais suscitou reações que levaram a considerar aspectos de ordem individual. Entre outros, René Boudon (apud CORCUFF, 2001), um dos expoentes dessa corrente, chamou tal tentativa de individualismo metodológico. Criticando o sociologismo ou o holismo da versão durkheimiana, ele questionou o postulado segundo o qual o indivíduo, sendo produto de estruturas sociais, poderia ser negligenciado. Ao contrário, de acordo com o individualismo metodológico, para explicar qualquer fenômeno social, é indispensável reconstruir as motivações dos indivíduos concernidos pelo fenômeno em questão e apreendê-lo como resultado da agregação dos comportamentos individuais ditados por essas motivações.

Contudo, a partir dos anos 1980, numa tentativa de superar as versões dicotômicas de compreensão, ou seja, contra o holismo e o individualismo, as novas sociologias tenderiam, então, a apreender indivíduos plurais, ou, de acordo com Corcuff (2001), indivíduos produzidos e produtores de relações sociais variadas. Sem a intenção de agrupar todas essas tendências em um pensamento unitário, o autor chama a atenção para o fato de que aquilo que ele qualifica de problemática construtivista não deve ser considerado como uma nova escola ou uma nova corrente dotada de homogeneidade. Trata-se mais de um espaço de problemas e de questões, sobre as quais trabalham pesquisadores diversos quanto a seus itinerários intelectuais, aos recursos conceituais utilizados, bem como em relação aos métodos empregados etc. Em uma perspectiva construtivista, as novas sociologias tenderiam, pois, a ver as realidades sociais como construções históricas e cotidianas de atores individuais e coletivos.

Em um empreendimento um pouco diferente, mas com a preocupação de fazer um diagnóstico do campo da produção sociológica nos anos 2000, Danilo Martuccelli (2002) salienta os limites de uma sociologia tradicional que busca apreender o indivíduo com base em certa representação do mundo social. Segundo o autor, a vontade original da sociologia é dar conta das experiências de modernidade que estão presentes na vida de cada um. Entretanto, pergunta-se: por que, paradoxalmente, entre todas as sociologias, as reflexões sobre o indivíduo sempre se colocam como uma dificuldade? Para Martuccelli, uma visão sociológica tradicional tenderia a conceber a significação e a trajetória das ações dos indivíduos deduzidas de sua posição e função em um domínio social constituído. As condutas constitutivas dos indivíduos seriam formadas e deformadas pelos agenciamentos das estruturas invisíveis, porém estruturariam as ações individuais. Os sujeitos seriam percebidos como produto de um entrelaçamento de forças de origem social.

Martuccelli (2002) considera que mesmo essa leitura estando ainda em voga, a situação atual obriga a repensar tal enquadramento. Na realidade, a crise da ideia de ator social, ou até a correspondência estrita entre trajetória social, processo coletivo e vivência pessoal, transformou-se radicalmente. Para o autor, a questão do social não pode mais ser apreendida exclusivamente a partir das posições sociais, a um sistema de relações sociais ou a certa concepção de ordem social. A novidade relativa na situação atual, segundo ele, provém do fato de que, daqui para frente, entre o vivido pelos atores e a linguagem dos analistas, a distância não cessa de crescer. As classes sociais, segundo ele, deixam de ser o formidável princípio de unidade política, intelectual e prático da vida social. Os estudos sobre trajetórias e experiências individuais tornam-se hesitantes. As fronteiras entre os grupos sociais, sem desaparecerem, fazem dos percursos experiências fluidas. Além de tudo, não existiriam universos fechados para os indivíduos. Nesse sentido, segundo o autor, seria difícil pensar os significados das ações ou suas determinações derivando exclusivamente da posição ocupada por um ator social em um contexto bem circunscrito.

Seriam constitutivas da modernidade a abertura de setores de atividades e a porosidade das fronteiras institucionais e grupais. A ação dos indivíduos não pode ser unicamente definida em termos de hierarquias, status, sistema de ordem e de posição. Assim sendo, Martuccelli (2002) afirma que a dificuldade da sociologia atual é adaptar a teoria às situações observadas. Contudo, alerta ele, o desafio será sempre estabelecer o laço entre experiências pessoais e jogo coletivo. Sua proposta é de que o estudo do indivíduo deva ser hoje material de reflexão da sociologia. A ideia de socialização, compreendida como processo progressivo de investimento no ator pelo social no qual ele se dotaria de competências para viver em sociedade, torna-se criticável, pois se está imerso em uma multiplicidade de orientações culturais. Como apreender a experiência dos indivíduos no momento em que os domínios culturais se diferenciam e os percursos sociais não possuem autonomia suficiente?

É mister estudar, segundo ele, os mecanismos que fazem, dos indivíduos, indivíduos - um processo complexo e com rupturas que exigem transformações de ordem metodológica, teórica e conceitual. A sociologia, reconhecendo a singularização crescente das trajetórias individuais, deve obrigar-se a desfazer-se da ideia de uma conexão homogênea entre todos os fenômenos. A sociologia atual deve representar a vida social como um quebra-cabeça, incerto e fragmentado. O que antigamente era visto como construído pelas instituições e formas sociais é agora pensado como produto de uma reflexividade. Os indivíduos são levados a tornarem-se indivíduos por eles mesmos.

Martuccelli afirma (2002):

Por razões indissociavelmente teóricas e históricas, o processo de constituição dos indivíduos está se tornando, verdadeiramente, um elemento de base da análise sociológica. No contexto atual, e principalmente a partir das considerações do que chamamos freqüentemente de maneira confusa globalização, o indivíduo é cada vez mais descrito como estando submetido a um conjunto de fenômenos abertos e contraditórios, onde se misturam, ainda uma vez, antigas certezas. A tarefa da sociologia será de dar conta dos laços ambivalentes entre esta situação global e a injunção de tornar-se um indivíduo. (p. 30)

Nesse sentido, o referido autor torna-se uma inspiração para pensar a participação singular dos indivíduos na construção de uma nova perspectiva sociológica, bem como as condições atuais do processo de socialização; ou seja, a multiplicidade de referências identitárias que circundam os sujeitos e a possibilidade de construção de habitus com híbridas disposições de cultura. Como ele mesmo argumenta, posto que o caminho socializador não é nem linear nem único, a identidade dos indivíduos é fruto de uma superposição e coexistência de diferentes tradições. Toda identidade é um amálgama de estruturas históricas anteriores dando lugar a uma série de conflitos internos, às vezes compreensíveis graças ao esclarecimento das diversas tradições de onde provêm.

Na modernidade, os arranjos identitários são surpreendentes, permitindo aos atores a passagem de um universo simbólico a outro, misturando-os ou mantendo-os intactos. As trocas e/ou exclusões são tão arbitrárias que é difícil supor, a partir de imbricações observáveis, uma afinidade eletiva entre os elementos. Segundo Martuccelli (2002), as hibridações são muito diversas, caprichosas e inesperadas. Tal construtivismo espontâneo está difícil de ser escondido, mas continuamos a pensar em fronteiras firmes, como se houvessem realidades culturais homogêneas e coerentes.

Outro referencial importante que corrobora o entendimento de um processo dialógico, híbrido e disperso da socialização pode ser encontrado na obra de François Dubet. No livro Sociologia da experiência (1996), entre outros, o autor reflete sobre uma crise de paradigma no interior da sociologia. Aponta certo esgotamento das contribuições da sociologia clássica nas questões relativas ao ator e ao sistema social. Segundo ele, a sociologia, representada por Émile Durkheim, Talcott Parsons e, de certa forma, Norbert Elias define o ator individual pela interiorização do social. Ou seja, a ação individual seria a realização das normas de um conjunto social integrado em torno de princípios comuns aos atores e sistemas.

Não obstante, tendo como base pesquisas empíricas, Dubet (1996) questiona essa interpretação, crendo que não é mais possível explicar a ação social a partir do modelo anterior. Ele sugere a noção de experiência para designar as condutas individuais e coletivas dominadas pela heterogeneidade de princípios de orientação. A noção de experiência social parece ser, segundo ele, a menos inadequada para designar as condutas sociais que não são redutíveis a puras aplicações de códigos interiorizados ou a encadeamentos de opções estratégicas que fazem da ação uma série de decisões racionais. Seriam condutas organizadas por princípios estáveis, mas heterogêneos, e é essa heterogeneidade o que permite falar em experiência, aqui definida pela combinação de várias lógicas de ação. A representação clássica da sociedade deixa de ser adequada no caso em que os indivíduos são obrigados a gerirem simultaneamente várias lógicas de ação que remetem a diversas lógicas do sistema social. Dubet (1996) segue afirmando que as combinações de lógicas de ação organizadoras da experiência social do indivíduo atual não têm centro, não se assentam sobre qualquer lógica única ou fundamental.

Não existe, pois, uma socialização com uma única lógica de ação. Processa-se uma espécie de separação entre a subjetividade do indivíduo e a objetividade de seu papel. A socialização não se finaliza, não porque o indivíduo escape do social, mas porque sua experiência inscreve-se em registros múltiplos e não congruentes. Para Dubet (1996), a heterogeneidade dos princípios da ação remete à heterogeneidade de sistemas de ação e à própria heterogeneidade dos mecanismos de determinação das lógicas da ação. É essa pluralidade, segundo ele, que permite falar em ator e não em agente, pois a construção de uma coerência da experiência e de uma capacidade de ação é exigida. As experiências sociais são combinatórias subjetivas de elementos objetivos. A sociologia da experiência não separa ator do sistema, não recusa sua unicidade. O autor afirma, porém, que, se a unidade das significações da vida social não está no sistema, ela só pode ser observada no trabalho do ator social, por meio do qual este constrói suas experiências.

Uma sociologia da experiência incita que se olhe cada indivíduo como um intelectual, como um ator capaz de dominar, conscientemente, pelo menos em certa medida, sua relação com o mundo. O ator não é redutível a seus papéis, nem a seus interesses. O indivíduo não adere totalmente a nenhum deles. Este tem como tarefa articular lógicas de ação, as quais se ligam a cada uma das dimensões de um sistema. O ator é obrigado a combinar lógicas de ação diferentes, e é a dinâmica gerada por essa atividade que constitui sua subjetividade e reflexividade.

Em síntese, para os interesses desse argumento, considera-se inspiradora a maneira como Dubet (1996) identifica a participação dos indivíduos na busca de uma coerência em suas práticas. Questionando o paradigma clássico da noção de socialização, ele oferece a categoria experiência como capaz de explicitar o empenho de articular a força das estruturas sociais na composição da ação individual. No complexo jogo da socialização compreende-se uma diversidade de dimensões, e o indivíduo é forçado a articular e buscar a coerência entre elas.

Uma proposta de observação

Com base no raciocínio exposto, o objetivo aqui é pensar a teoria da socialização segundo um ponto de vista relacional, articulando as principais agências educativas da modernidade, sejam elas a família, a escola, o grupo de pares, o trabalho, entre outras. Considera-se que a articulação das propostas de socialização de cada uma delas é atribuição dos sujeitos, variando segundo a origem, as expectativas de reprodução dos grupos, bem como de acordo com as experiências individuais de cada um deles. Assim, para melhor compreender o fenômeno da socialização, propõe-se pensar essa prática como um fato social total, isto é, uma ação social vivida por uma dinâmica processual, com base na troca de mensagens simbólicas entre agências e agentes socializados, o que envolve simultaneamente todos os indivíduos, em todas as suas esferas de atuação, com a tarefa de manter o contrato e o funcionamento da realidade social.

Trata-se de uma construção reflexiva que ajuda também a circunscrever as instâncias de socialização numa perspectiva dialógica, tendo como eixo central a participação do sujeito social em seu processo educativo. Mais do que isso, leva a pensar essas instâncias em suas dimensões econômica, moral, estética e política, entre outras, dimensões responsáveis pela formação de um habitus, sistema de disposições, tal como apontado por Pierre Bourdieu. No entanto, diferente das proposições desse autor, é realçado o processo de socialização das formações atuais como sendo um espaço plural ou híbrido de múltiplas referências identitárias. Ou seja, a modernidade caracteriza-se por oferecer um ambiente em que o indivíduo encontra condições de forjar um sistema de referências que mescle as influências familiar, escolar e midiática, entre outras; um sistema de esquemas coerente, mas mesclado e fragmentado. Embora se saiba que no contexto moderno cada uma das instâncias formadoras desenvolva campos específicos de atuação, lógicas, valores éticos e morais distintos, considera-se ainda que são os próprios indivíduos que tecem as redes de sentido que os unificam em suas experiências de socialização. É o indivíduo que tem a capacidade de articular as múltiplas referências propostas ao longo de sua trajetória. É o sujeito a unidade social na qual se podem efetivar diferentes sentidos de ações, estas últimas derivadas de suas múltiplas esferas de existência. Nele cruzam e interagem sentidos particulares e diferentes. Ele não é apenas o único portador efetivo de sentidos, mas a única sede possível de relações entre estes.

Assim sendo, opta-se por uma perspectiva sociológica. Ou seja, busca-se a relação dialética entre indivíduo e sociedade. Procura-se uma forma de interpretar as ações sociais, as práticas coletivas, com base em uma troca incessante entre as duas faces de uma mesma realidade (o indivíduo e as matrizes sociais de cultura). Analisando-se o processo de socialização com base na articulação das ações educativas de várias instâncias produtoras de bens simbólicos, pretende-se compreender o jogo de reciprocidade, interação e hibridação simbólica estabelecido pelos sujeitos.

Trabalha-se com a hipótese da existência de vários modelos de articulação entre as matrizes de sentido responsáveis pela formação de sujeitos sociais singulares. Assim sendo, cabe perguntar, qual é o papel de cada uma dessas instâncias na vida dos sujeitos sociais? Quais são os pontos de ruptura ou convergência entre elas? Em outras palavras, como se estabelece a composição das disposições de habitus dos indivíduos? Como pensar a ação, ou seja, a força e a determinação das múltiplas agências socializadoras e suas distintas referências na construção do indivíduo da atualidade?

Na tentativa de responder a essas inquietações buscou-se o referencial de Marcel Mauss (1974). Sendo fiel às suas formulações, a socialização aqui pensada como fato social total não chega a ser total pela simples reintegração dos aspectos descontínuos: familiar, escolar, religioso, midiático de cada um deles. É preciso, ainda, que o fato social total - socialização - encarne-se em uma experiência individual, ou seja, primeiro em uma história individual que permita observar o comportamento dos seres totais e não divididos em faculdades; segundo, a partir de um sistema de interpretação que simultaneamente considere os múltiplos aspectos (físico, psíquico, sociológico) de todas as condutas.

O fato social total apresenta-se, pois, com um caráter tridimensional. Deve fazer coincidir a dimensão propriamente sociológica com seus múltiplos aspectos sincrônicos: a dimensão histórica, ou diacrônica; e, finalmente, a dimensão fisiopsicológica. Ora, é só nos indivíduos que esta tríplice abordagem pode ser feita. [...] A noção de fato social total está em relação direta com a dupla preocupação, que para nós havia parecido única até agora, de ligar o social e o individual de um lado, o físico (ou o fisiológico) e o psíquico de outro. (LÉVI-STRAUSS, 1974, p. 14-15)

Concordando com Paulo Henrique Martins (2008), essa visão corresponde a uma leitura que resgata a participação do sujeito na construção do social. Trata-se de entender esse agente não mais como mero suporte mecânico, mas como capacidade expressiva, um sujeito que se perceba no outro e que os dois sejam seres igualmente atravessados pelo mesmo mundo. Nesse sentido, é uma forma de pensar a dimensão sistêmica sem perder de vista o vivido. A socialização encarada com base na noção de fato social total é concebida não como uma realidade bruta, mas como um processo eficaz de reciprocidades de símbolos, ou uma rede diversificada de valores que se insere no mais profundo dos indivíduos, em suas disposições de cultura. Desse modo, evidencia-se uma maneira mais dialética de conceber o social; não há uma escolha de protagonismo entre indivíduo e sociedade, pois ambos são duas totalidades articuladas em contextos histórica e socialmente bem definidos.

Inspirado em uma perspectiva construtivista, na acepção de Corcuff (2001), o processo de socialização aqui matizado enfatiza, pois, a relação de mão dupla entre indivíduo e sociedade. na construção da realidade social. Potencializando-se o processo de socialização com o conceito de fenômeno social total, ressalta-se o aspecto simbólico das trocas como fundamento último das relações sociais entre pessoas morais em suas múltiplas dimensões. O valor da socialização não está, assim, na reciprocidade, na dádiva simbólica simplesmente, mas no vínculo essencial entre indivíduo e sociedade, o que reforça o entendimento relacional dos distintos projetos das instâncias e agentes socializados. Dessa forma, tais formulações auxiliam no juízo sobre as relações de interdependência e simultaneidade entre a constituição da sociedade, a constituição de uma cultura e, por fim, porém não em ordem de importância, a constituição do indivíduo - três momentos paralelos da construção da sociedade realizados pela socialização (SETTON, 2009b).

De fato, concordando com Jean Michel Berthelot (1988), a socialização reflete um campo de investigação que mescla simultaneamente estruturas, atores, sentido e história. Pensado a partir de um amplo panorama, o processo de socialização explicita a ideia de continuidade, algo que tem uma biografia, que demanda uma compreensão diacrônica dos fenômenos produtores de sentido. Afastando-se das leituras cristalizadas acerca dessa noção, empenha-se em aproveitar seu potencial analítico explorando a relação dialógica presente em todos os processos de interação social (SETTON, 2009a).

Recuperando a ambiguidade dos processos socializadores, ora vistos como controle e condicionamento, ora vistos pela perspectiva da integração e do pertencimento, é preciso advertir que, em todo escopo de análise, deve-se identificar a variação da força dos recursos que cada agente ou instituição acumula ao longo de uma trajetória. Socializados e socializadores, no espaço de luta simbólica da socialização, têm poderes, todavia, certamente diferenciados entre si. Assim, debruçar-se sobre as articulações entre as agências socializadoras a partir da ótica relacional com o indivíduo é um convite para o entendimento da constituição dos poderes e domínios, a luta e a indissociabilidade simbólica entre indivíduos e sociedade.

A proposta do processo socializador desta reflexão exige ainda o conceito de hibridação. Ele parece ser o mais adequado para as investigações que buscam observar o processo de construção de estruturas mentais e práticas promovidas nas difusas, diversas e heterogêneas experiências de socialização da contemporaneidade. Sem planejamento, como resultado imprevisto da mundialização das culturas, a hibridação designa um processo intercultural dinâmico, fragmentado, mas também criativo; individual e coletivo, mas, ao mesmo tempo, contraditório e tenso, pois resulta do enfrentamento de valores culturais dispostos em uma hierarquia de poderes e privilégios.

De certa forma, o conceito de hibridação, com base em uma perspectiva processual, permite pensar que o processo de socialização, seu resultado e as disposições de cultura individual estão em constante construção. Como diria Nestor García-Canclini (2003), em um mundo tão fluidamente interconectado, as sedimentações identitárias organizadas em conjuntos históricos mais ou menos estáveis são reestruturadas por meio de conjuntos de valores interculturais e, portanto, interétnicos, transclassistas e transnacionais.

Ao estudar processos socializadores contemporâneos, é forçoso conhecer, sobretudo, as variadas formas de articulação, a interdependência das matrizes e entender como são produzidas as mesclas, as hibridações, nas disposições individuais. Não se pretende descrever somente as combinações interculturais, mas objetiva-se circunscrever as relações estruturais de causalidade (a conjuntura social que a predispõe) e, notadamente, interpretar as relações de sentido que se reconstroem nessas misturas (o que se tem a partir daí). O processo de hibridação em uma sociedade injusta e constituída pela distribuição desigual de recursos não pode ser pensado apenas como uma fusão de valores interculturais. Ao contrário, exige-se que, junto a essa perspectiva, fique-se atento aos conflitos nele produzidos. Tal como diz García-Canclini (1997), o processo de hibridação espelha um conjunto de estratégias de entrada e saída da modernidade, estratégias que subjugam ao mesmo tempo em que ampliam realizações.

Propõe-se, então, uma análise na qual a interdependência entre as instâncias de socialização e os indivíduos faça-se presente. Dessa forma, na tentativa de ampliar o escopo das evidências de um hibridismo cultural, poder-se-ia investigar, mais detidamente, casos concretos de articulação de sentidos vividos e expressos por uma experiência individual. Tal proposta é, pois, bastante provocativa. Existe e é possível concretizar empiricamente a articulação de interdependência entre as matrizes de cultura? Como compreender o imbricado e conflituoso processo de construção das disposições híbridas de habitus?

Em trabalho anterior (SETTON, 2009b), a análise das híbridas experiências socializadoras com base nas práticas de lazer entre jovens brasileiros ofereceu pistas sobre o espírito de um tempo em que os determinismos classistas não dão mais conta de expressar a totalidade das diferenças ou semelhanças entre eles. Outras variáveis de marcação ou distinção social, como as mídias, o processo de mundialização e o grupo de pares, são importantes para o entendimento da realidade cultural desse grupo. No entanto, como essa articulação se realiza na experiência individual? De que forma as experiências socializadoras de um indivíduo podem revelar o processo de incorporação de disposições híbridas de habitus?

As questões são muitas e o campo de investigação é vasto. Por ora, a reflexão apresentada pretende estimular os estudos relativos aos processos socializadores nos âmbitos institucional e individual, bem como auxiliar no difícil procedimento de investigar a construção das disposições de habitus com base na observação cuidadosa dos mecanismos e estratégias formadoras. Provoca a leitura sobre o alcance e o limite de cada uma das matrizes de cultura e, simultaneamente, permite perscrutar sobre o movimento de ascensão de novas agências socializadoras.

  • Correspondência / Contact:

    Faculdade de Educação Universidade de São Paulo

  • Recebido em: 27.10.2010

    Aprovado em: 15.02.2011

    Maria da Graça Jacintho Setton é professora de Sociologia da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo e livre-docente pela mesma universidade.

  • 1

    - A pesquisa teve início nos anos 1980 e contou com o financiamento da FAPESP em 1989, 1997, 2000 e no período de 2005 a 2007.

  • 2

    - Diferentemente de Bernard Lahire (2004b), considera-se que o conceito de

    habitus ainda é útil e necessário. O argumento que o autor desenvolve em

    O homem plural "é que se definimos o

    habitus como um sistema homogêneo de disposições gerais, permanentes [...], então cada vez menos agentes de nossas sociedades serão definíveis a partir de um tal conceito" (p. 318).

  • 3

    - Esse esforço teve início em trabalhos anteriores (SETTON, 2002, 2004a, 2005a, 2005b, 2009a).

  • 4

    - A relação entre indivíduo e sociedade, mesmo que tradicional no campo da sociologia, vem recebendo há um tempo uma atenção maior, sobretudo no sentido de empreender uma leitura mais dialética desse fenômeno. Uma discussão próxima ao tema da socialização pode ser encontrada em Martuccelli (2002, 2005), Corcuff (2003, 2005) e Dubet (2005), entre outros. É notável também o esforço dos sociólogos Norbert Elias e Marcel Mauss nessa direção, ainda que poucos tenham dado ênfase a esse aspecto.

  • 5

    - A proposta de pensar as disposições de

    habitus dos indivíduos contemporâneos como híbridas encontra-se mais bem elaborada em Setton, (2002, 2009a, 2009b).

  • 6

    Le déclin de l´institution (2002) e

    En la escuela: sociologia de la experiencia escolar, escrito com Danilo Martuccelli (1998).

  • 7

    - As noções de indivíduo, sujeito, ator e agente social são usadas como sinônimos, ainda que se tenha consciência das distinções teóricas operadas pela sociologia e pela filosofia. Espera-se que essas reflexões deem suporte para considerações acerca dos usos e da necessidade dessas diferentes nomenclaturas.

  • 8

    - Como diria Lahire (2004a), disposições, competências, habilidades, tendências, diferentes noções que explicitam diferentes formas de incorporação de culturas.